Opinião- Getúlio Cavalcanti: tua dor é nossa dor…

“O ciclo natural da vida se dá quando o filho se torna pai do seu pai”.

Ontem (04/03/19), na sala de minha humilde residência dividindo ali a TV com minha genitora, recebo a triste notícia da despedida de Getúlio Cavalcanti dos blocos líricos.

Impressionante como a vida é mão dupla, vai e vem, até parece que foi combinado entre o destino e a vida.

Em 1982 Getúlio Cavalcanti compôs o clássico frevo de canção: “Último Regresso” retratando em música a realidade, a vida imitando a arte, em 1982 o Bloco Lírico Banhistas do Pina, choravam a dor da despedida. Seria o último ano de desfile do bloco devido a problemas financeiros.

Foi assim que Getúlio Cavalcanti nos presenteia e imortaliza o refrão mais pernambucano do mundo onde diz:
“Não deixem não, que o bloco campeão,
guarde no peito a dor de não cantar.
Um bloco a mais é um sonho que se faz
o pastoril da vida singular.
É lindo ver o dia amanhecer,
ouvir ao longe pastorinhas mil,
dizendo bem, que o Recife tem,
o carnaval melhor do meu Brasil”.

O fato que um dia Getúlio Cavalcanti toma como base para compor seu belo Frevo “ÚLTIMO REGRESSO”, foi ontem realidade. A Vida imitando a arte. Getúlio ontem sentiu o sabor amargo da despedida. A hora do adeus!

Entendi bem todas as lágrimas do nosso Getúlio: Príncipe dos Blocos, título que recebeu que antes pertencia a outro ícone do blocos líricos: Edgar Morais.

Creio eu, na minha humilde e insignificante opinião, que naquele volume de choro existem as mais variadas dores:

A DOR NATURAL DO TEMPO: onde o homem se rende às limitações vitais, enxerga que é hora de parar, de ceder lugar aos que estão chegando. Momento de reconhecer que seu tijolo no muro da história por estar no lugar certo, não se precisa mais de sua colaboração, sua participação operacional será substituída pelo legado construído;

A DOR DO CAPITALISMO: perceber que a mídia de massa e capitalista vem de forma avassaladora destruindo nossa identidade, nossa cultura. Atrações que não possuem coerência com nossa cultura ocupar lugar de nomes que assim o fazem;

A DOR DA INÉRCIA GOVERNAMENTAL: perceber que quem foi eleito para nos representar, rendem-se aos caprichos e interesses pessoais, cruzando os braços e nada fazendo pela nossa cultura.

Embora há 03 anos não brinco mais carnaval em minha querida João Alfredo – PE, que já teve o título de Olinda do Agreste, por questões pessoais e culturais.

Amargo a dor da descaracterização de nossas tradições, nosso Corredor da Folia tem sentido o sabor do fracasso anualmente.
O Frevo, ritmo genuinamente pernambucano, pois não existe em lugar nenhum do mundo, apenas em Pernambuco, sendo escanteado, jogado para fora do palco pelo axé, funk, brega, enfim.

Senti uma enorme dor em 03/03/19, ao ver um vídeo no Instagram postado pelo nosso “Repórter que chega primeiro”, nosso competente Luís Correa, fazendo a cobertura do carnaval de Bom Jardim – PE.

Maior celeiro de músicos do Agreste de PE e porque não dizer de PE, terra de nomes como o imortal Mestre Vivo – LEVINO FERREIRA, BRÁULIO DE CASTRO, CLÁUDIO SEDÍCIAS, DIMAS SEDÍCIAS, VALDA, LULA e todo clã SEDÍCIAS, sem contar nos irmãos Barbosa: Felipe – Sargento da PMPE e Regente da Banda de Música da PMPE, Julião Barbosa – também militar, só que da Marinha, Clarinetista ímpar de Bom Jardim. 
O professor Dário, e tantos outros nomes que passaria aqui a vida citando os nomes da nossa Terra Mãe como costumo falar, pois João Alfredo já foi distrito de Bom Jardim e sinto orgulho disso.

Enfim, como se não bastasse tanto legado e orgulho musical, vejo no vídeo postado pela cobertura do nosso repórter Luís Corrêa um dos maiores blocos de rua de Bom Jardim: O Come e Dorme, uma multidão tomando conta das ruas, não se via um palmo de asfalto descoberto.

Vocês podem estar se perguntando: E onde está a dor, já que se viu tanta gente no bloco?

Lá vai nobre leitor.

Como Bom Jardim é terra de música, pensei assim como você pensou que o bloco seria puxado ao som de um bom Frevo, pois pasmem!

Um paredão de som puxava o bloco e tocando Funk!

Que dor tão grande senti…

Talvez essa minha dor, também esteja bem representada pelas lágrimas de Getúlio Cavalcanti, ao declarar sua despedida dos blocos líricos.

Choramos contigo Príncipe dos Blocos, assim como também chora o nosso Bráulio de Castro, Edgar Santos, Felipe e Julião Barbosa, Mac Sedícias e todo o clã Sedícias. Como também engrossam o cordão do choro: Dimas Santos, médico Antônio Carlos, Doca, Mestre Alexandre, João Vicente Ferreira, Boró, Biina, Comadre Jane, Alonço, Abeinha (Orlando), Dr. Jaime Adrião, Calumbi, Wilda Sousa, Maestro Mê (homenageado do Carnaval 2019), Danda, Zé Vieira, Edson Guilhermino e tantos outros filhos de João Alfredo que lutaram e lutam pela preservação da nossa cultura.

Desafio qualquer ser humano que nasceu em nosso solo Pernambucano que ao ouvir a melodia do tradicional frevo VASSOURINHAS consiga ficar parado, todo seu corpo.

Duvido!

Você pode até não saber dar os passos, mas seu corpo irá responder imediatamente, mexendo sequer um dedo.

O frevo é mágico!

O frevo é nosso!

Respeitem nossa cultura!

Respeitem nossos imortais!

Respeitem o nosso povo!

Respeitem Getúlio Cavalcanti, Levino Ferreira, Felino e tantos outros nomes!

Tua dor é nossa dor Getúlio Cavalcanti!

Choramos hoje a dor da ingratidão, mas nunca da nossa vocação de preservar nosso frevo!

Viva GETÚLIO CAVALCANTI!
Viva o ÚLTIMO REGRESSO!
Viva os Banhistas do Pina!
Viva o Frevo!
Viva Pernambuco!

Evoé Brasil!

João Alfredo (PE), 05 de março de 19
Adm. Benízio Elias da Silva Filho – DUY
CRA-PE 6872
Consultor Empresarial
Produtor Cultural
Ex-aluno do Teatro Brincantes de Antônio Nóbrega (SP)
Membro da Sociedade Musical Dom Bosco
Brincante