Graças à movimentação do senador Flávio Bolsonaro, Sergio Moro ganhou um novo sentido para permanecer à frente do Ministério da Justiça. Incorporou-se à paisagem de Brasília como atração turística. Em seis meses e meio de gestão, todos os objetivos do ministro subiram no telhado. Mas ele vive uma metamorfose que surpreende os amigos e diverte os inimigos.
Com a decisão do Congresso de arrancar o Coaf do organograma da sua pasta, Moro perdeu o elã. A prioridade à reforma da Previdência, em detrimento do pacote anticrime, roubou-lhe a sensação de utilidade. O vazamento das mensagens trocadas no escurinho do Telegram transformou-o em frequentador de estádios de futebol. Tudo muito distante dos planos originais.
Quando muitos começavam a questionar a presença de Moro em Brasília, sobreveio a novidade: a pedido do Zero Um, Dias Toffoli, o presidente do Supremo, expediu uma liminar que converte o Coaf em órgão decorativo. Perto do esforço do filho do presidente para abafar o escândalo que o enreda, a articulação feita pelo centrão para devolver o Coaf ao Ministério da Economia é coisa de amadores.
Dizia-se que, mesmo sob Paulo Guedes, o Coaf continuaria submetido ao objetivo primordial de Moro: seguir o dinheiro. A cruzada do primogênito do presidente contra o órgão de controle pede uma redefinição. Ficou entendido que, sob Bolsonaro, o papel do Coaf não é mais o de repassar para o Ministério Público dados sobre movimentações bancárias de vidro como as de Flávio e do faz-tudo Fabrício Queiroz.
Dias antes de sentar-se na cadeira de ministro, Sergio Moro afirmara: “Eu não assumiria um papel de ministro da Justiça com o risco de comprometer a minha biografia, o meu histórico”. Instado a explicar o seu papel na fixação de novos padrões éticos no governo de Bolsonaro, o ex-juiz declarou o seguinte:
“Defendo que, em caso de corrupção, se analisem as provas e se faça um juízo de consistência, porque também existem acusações infundadas, pessoas têm direito de defesa. Mas é possível analisar desde logo a robustez das provas e emitir um juízo de valor. Não é preciso esperar as cortes de Justiça proferirem o julgamento”.
Um frêmito percorreu a espinha das autoridades que ouviram, com temor quase reverencial, as palavras de Moro. Entretanto, depois que a relevância turística do ex-magistrado superou sua dimensão técnica, todos podem observá-lo sem receio. Moro tornou-se inofensivo.
O ministro Marcelo Alvaro Antonio (Turismo), por exemplo, a despeito da fama de administrador do laranjal do PSL em Minas Gerais, já coabitava com Moro as mesmas fotos de reuniões ministeriais como se posasse ao lado das cataratas de Iguaçu, onde o perigo é apenas presumido. Agora, a proximidade com primogênito de Bolsonaro dá a Moro uma aparência de Vênus de Milo. O silêncio do ministro estimula o debate sobre a forma como ele perdeu os braços.