Em uma iniciativa inédita na corrida pela vacina da Covid-19, a britânica AstraZeneca e o Instituto de Pesquisa Gamaleya, da Rússia, anunciaram que vão combinar as duas substâncias em um novo teste clínico, previsto para começar ainda neste mês. Os dois imunizantes usam o protocolo de adenovírus, no qual um micróbio inofensivo aos humanos leva informações sobre a proteína spike do Sars-CoV-2 para dentro do organismo, estimulando a produção de anticorpos capazes de reconhecer e matar o invasor.
“Anunciamos um programa de testes clínicos para avaliar a segurança e a imunogenicidade da combinação da ASD1222, desenvolvida pela AstraZeneca e a Universidade de Oxford, e da Sputnik V, desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Gamaleya”, anunciou a unidade da AstraZeneca na Rússia, em um comunicado. Os ensaios clínicos incluirão voluntários com mais de 18 anos.
Também em comunicado, o Fundo Soberano Russo, que participa no desenvolvimento da vacina, afirma que propôs, em novembro, à AstraZeneca o uso de um dos dois componentes da Sputnik V. “A AstraZeneca aceitou a proposta (…) de usar um dos dois vetores da vacina Sputnik V nos testes clínicos adicionais de sua vacina, que começarão antes do fim do ano”, indicou o texto. “As combinações das diferentes vacinas contra a covid-19 podem ser uma etapa importante para criar uma proteção maior”, destacou a AstraZeneca, explicando que, ao unir duas pesquisas, é possível obter uma “resposta imunológica melhor”.
A Rússia afirmou que sua vacina tem eficácia de 95%. Atualmente, está na fase três de testes clínicos em 40 mil voluntários. O país iniciou, na semana passada, a vacinação em parte da população. A AstraZeneca e a Universidade de Oxford informaram que o imunizante desenvolvido na Inglaterra tem eficácia de 70%, em média.
Adiamento
Já os laboratórios Sanofi e GSK, francês e britânico, respectivamente, anunciaram ontem que a vacina contra a covid-19 que desenvolvem em conjunto não ficará pronta até o fim de 2021, depois de resultados abaixo do esperado nos primeiros testes clínicos. O programa foi “adiado para melhorar a resposta imunológica nas pessoas mais velhas”, afirmaram as empresas em comunicado.
Os dois laboratórios esperam disponibilizar a vacina no quarto trimestre do próximo ano. O plano original era apresentar um pedido de licença no primeiro semestre de 2021 e distribuir um bilhão de doses. A Sanofi, que está desenvolvendo a vacina em parceria com a GSK — a fornecedora do adjuvante — havia informado, recentemente, que esperava iniciar os últimos testes em humanos no fim de dezembro.
Os resultados provisórios dos primeiros testes (fases um e dois) não atingiram as expectativas: embora a resposta imunológica em adultos com idade entre 18 a 49 anos seja “comparável à de pacientes que se recuperaram da infecção por covid-19”, ela é “insuficiente” nos adultos mais velhos, afirma o comunicado. Em consequência, os laboratórios desejam “aperfeiçoar a concentração de antígenos para obter uma alta resposta imunológica em todas as faixas etárias”, completa a nota.
“A fórmula do produto não é satisfatória. É importante otimizá-la, e isso pode levar um pouco mais de tempo”, declarou à agência France-Presse (AFP) Thomas Triomphe, vice-presidente da divisão de vacinas da Sanofi, que admitiu um anúncio “decepcionante”. Os laboratórios organizarão uma fase de testes complementares a partir de fevereiro, baseados em um estudo recente em primatas não humanos, com uma fórmula de antígenos aprimorada. “Quando injetamos uma forte quantidade de vírus em animais que receberam a vacina, nós tivemos excelentes resultados, o que nos dá confiança”, destacou Triomphe.
Campanhas
Onze vacinas estão na última fase de testes clínicos. Várias já tiveram os resultados de eficácia publicados, como a americana Pfizer, que trabalha em colaboração com a empresa alemã BioNTech. O Reino Unido autorizou a administração do produto e iniciou uma campanha de vacinação na terça-feira. O imunizante da empresa americana Moderna pode receber autorização na próxima semana, nos Estados Unidos.
Nesse contexto, a vacina da GSK e Sanofi pode chegar muito tarde. “São de três a quatro meses de atraso, mas, no fim das contas, com mais informações sobre uma fórmula melhor”, disse Triomphe. As duas farmacêuticas assinaram vários contratos de entrega, um deles com a União Europeia, que reservou 300 milhões de doses para 2021.
De modo geral, o desenvolvimento de uma nova vacina leva tempo e dinheiro — US$ 1,2 bilhão e 10 anos, em média, de acordo com especialistas. No caso da covid-19, porém, a pesquisa, estimulada por um financiamento excepcional e por parcerias público-privadas, derrubou os prazos tradicionais.
Pfizer até terça-feira
O secretário de Saúde dos Estados Unidos, Alex Azar, estima que a vacina Pfizer/BioNTech contra a covid-19 comece a ser administrada na população na segunda ou na terça-feira, assim que for aprovada pelas autoridades reguladoras. O uso foi recomendado, na última quinta, por uma comissão consultiva da Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA). A expectativa é de que órgão regulado emita sua aprovação definitiva “nos próximos dias”. As doses serão entregues diretamente aos hospitais e a farmácias, que vão vacinar inicialmente os grupos prioritários: residentes de lares de idosos e profissionais da saúde.