As eleições municipais deste ano foram marcadas pela representatividade e pela diversidade de seu eleitorado. Antes mesmo dos votos, as candidaturas tiveram recorde de pessoas negras e mulheres, outra conquista foi a possibilidade de usar o nome social para concorrer aos cargos de vereador e prefeito. Pretos e pardos representaram 50% dos candidatos, destes, 32% foram eleitos no primeiro turno.
Números ainda distantes da igualdade, mas já mostram algum avanço no quesito representatividade. De acordo com DeltaFolha, em comparação com as eleições municipais de 2016, negros somavam 29% dos eleitos no primeiro turno. Foi a primeira vez que o uso de nome social foi permitido e, com isso, 171 pessoas se candidataram a vereadores desta forma. Nenhum candidato à prefeitura usou nome social.
A professora de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (PPGCS) Mayra Goulart celebra o aumento na participação de candidatos e das candidaturas vitoriosas de pretos e pardos e de mulheres, que bateram recorde e ocuparam 33,6% das candidaturas.
“Eu acho que isso é uma vitória mesmo a gente tendo um panorama de brancos e homens como maioria dos candidatos eleitos. Segundo os números do TSE, em relação a 2016 os prefeitos eleitos brancos somavam 70,4% contra 29% de negros. Em 2020, a gente tem os brancos com 67% e o resto negros e pardos (33%). Então, teve um aumento significativo na participação de negros e pardos. No caso das mulheres é a mesma coisa. A gente vê que os números ainda não indicam uma maioria de mulheres ou mesmo uma paridade, mas indicam, sim, um aumento no número de mulheres eleitas.”
A vereadora Duda Salabert (PDT) foi a primeira transexual eleita em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais. Com mais de 37 mil votos, ela disparou na liderança da Câmara de BH, em uma votação recorde na capital mineira. “Quando uma travesti avança, a sociedade inteira avança. Fizemos a campanha sem imprimir um santinho, um panfleto ou adesivo. Foi uma campanha lixo zero”, comemorou nas redes sociais. Duda é professora e, em 2018, foi a primeira transexual a concorrer ao cargo de senadora. Na época, ganhou mais de 350 mil votos e se tornou a quarta mulher mais votada da história de Minas Gerais.
Nove prefeitas
No Brasil, nove mulheres negras foram eleitas prefeitas no 1º turno. O resultado mostra uma mulher a menos que em 2016, de acordo com o DeltaFolha. Apesar de negros e mulheres serem maioria na população brasileira, o eleitorado do país não espelha isso. Curitiba elegeu, no último domingo (15/11), a primeira vereadora negra da história da cidade. A historiadora Ana Carolina Dartora (PT) teve mais de 8 mil votos.
A cidade de Aparecida de Goiânia, na região metropolitana de Goiás teve, em toda a história, apenas três vereadoras. A última legislatura de vereadores não teve nenhuma representante mulher na Câmara da cidade. Para o próximo ano, duas candidatas foram eleitas: Valeria Pettersen (MDB), com 2.523 votos, e Camila Rosa (PSD), com 2.378 votos.
Para a atriz Paula Pereira, 26 anos, moradora de Goiânia (GO) e negra, a diversidade saiu das urnas fortalecida. “Isso mostra como as pessoas estão incomodadas com esse governo, elas querem ver mudanças, elas querem se ver representadas na política. Eu acredito que isso seja uma resposta ao desgoverno que a gente vem passando nesse país nos últimos dois anos. Ver a eleição de mulheres negras, transsexuais, homens negros, índios, quilombolas é uma vontade de mudar a política nacional mesmo que comece de baixo, a partir de vereadores”, pontuou.
Representações indígenas também assumem prefeituras no país. Ao todo, foram oito municípios, mas esse número ainda pode aumentar. As cidades foram São Gabriel da Cachoeira (AM), Uiramutã (RR), Normandia (RR), Marechal Thaumaturgo (AC), Pariconha (AL), Marcação (PB), São João das Missões (MG) e Arroio Grande (RS). A maior concentração de candidatos indígenas estava nas regiões Norte (927) e Nordeste (507).
“Outro elemento da diversidade é que a gente tem três grandes vertentes para comentar no resultado das eleições. É a derrota do bolsonarismo, a ascensão de uma esquerda multicêntrica entre PT e PSOL e o reforço poderio do centrão ou das direitas tradicionais. Então, a gente tem esses três segmentos para pensar cenários futuros e esses três segmentos são vetores que não necessariamente se alinham”, comenta Mayara Goulart.
Mayra afirma, ainda, que o resultado demonstra uma queda do conservadorismo. “O bolsonarismo ter chegado ao poder diz menos respeito a uma população que é radicalmente conservadora e mais a uma computadora nas eleições em que diferentes segmentos sociais apoiaram Bolsonaro por estarem, de alguma maneira, descontentes com as administrações petistas. Então, eu acho que o conservadorismo está voltando para um lugar que ele sempre esteve, que é um lugar de uma minoria”, finalizou.