Por: Henrique Lessa – Correio Braziliense – A constante utilização da máquina pública em ações eleitorais é vista como um risco à manutenção da reeleição no país. É o que afirma o prefeito de Araraquara (SP), Edinho Silva (PT), coordenador de comunicação da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência.
“Estão acabando com a reeleição. Como vai segurar prefeitos em 2024? Ou o Judiciário defende a Constituição ou acaba com a reeleição. Isso é grave, mas nós não vamos abordar isso. A passividade do Judiciário é o que está dando um ponto final na reeleição no Brasil”, disse Silva. A reclamação de diversos integrantes da campanha petista refere-se a uma passividade da Justiça Eleitoral com ações do governo federal consideradas abusivas pela campanha.
O ex-presidente Lula já afirmou que, no caso da sua vitória, não pretende concorrer à reeleição em 2026. “Eu tenho quatro anos da minha vida para dedicar, para cuidar desse povo”, declarou em uma entrevista para uma rádio da Bahia. Isso não quer dizer que o partido não deva levar o tema ao Congresso. Segundo Silva, “a questão da reeleição é uma questão do Congresso, não uma pauta de governo. O Ministério Público (MP) deve buscar junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) coibir o uso da máquina pelo presidente Jair Bolsonaro (PL)”.
PEC das bondades
Para o jurista Lenio Streck, “há fatos objetivos que demonstram facilmente estar havendo um abuso de poder econômico nunca visto na história”. Para Streck uma questão central são as fake news, que entende serem apenas uma cortina de fumaça para encobrir o que realmente importa: as bondades econômicas, o uso da máquina estatal. “A máquina pública nunca foi tão usada, tudo que a legislação eleitoral proíbe. Isso é gravíssimo”, aponta o jurista.
“O voto a cabresto, que se fazia no passado, é pequeno em comparação com o que se faz hoje: a PEC das bondades, o dinheiro aos taxistas, o dinheiro do FGTS, o consignado, além do orçamento secreto com verbas utilizadas em favor de alguns candidatos”, enumerou o especialista.
Apesar de apontar a utilização da máquina pública nessas eleições presidenciais, Streck acredita que isso não deve se replicar em 2024, como apregoa Edinho Silva. Para ele, nos municípios a situação seria mais controlada. “Em 2024, como se trata de prefeituras, o micro poder é mais controlado. Se alguém usar a bicicleta da prefeitura, estará lascado”, apontou o jurista. E completou: “No Brasil, a lei é como a serpente, só pica os descalços”. Ele também destacou a necessidade de se repensar a forma e a própria reeleição no país.
Segundo o advogado Miguel Fiod, presidente da comissão de direito eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF), as medidas do governo podem ser questionadas como abuso do poder político, mas ele observou que pode ser complicado para o candidato da oposição questionar um auxílio dado aos mais necessitados. Para ele, “a tendência é essas ações entrarem após as eleições questionando os abusos”.
PT foi contra reeleição apesar de se beneficiar dela
Em 1996, quando foi aprovada a emenda constitucional que autorizou a reeleição no Brasil, o PT votou contra a proposta que terminaria possibilitando um segundo mandato para Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Na época, mesmo com inúmeras denúncias de compras de votos pelo governo de FHC, a medida acabou virando lei.
A norma beneficiou inúmeras vezes o PT, como na reeleição do ex-presidente Lula, da ex-presidente Dilma Rousseff, além de uma série de governadores e prefeitos do partido. Desde então, o partido não tem mais defendido o fim da reeleição. Quando disputaram a reeleição para a Presidência da República, os petistas também editaram decretos que permitiram investimentos federais em obras durante a época eleitoral.
Esses repasses voluntários, que permitem investimentos federais em novas obras, proibidos em período eleitoral, passaram a poder ser transformados em obrigatórios, permitidos mesmo durante as eleições, por meio de decreto, graças a uma medida provisória transformada em lei, no segundo governo Lula, aprovada sob o argumento de não paralisar as obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).