O desembargador José Viana Ulisses, da Câmara Regional de Caruaru, acatou o recurso da Prefeitura de Caruaru, autorizando a realização do show do cantor Wesley Safadão no próximo sábado (25/6). O magistrado alega que restou comprovado que, ao contrário do que se afirma na ação popular, a origem dos recursos não é do erário público municipal. O documento nº 1150849 – ofício exarado pela Fundação de Cultura e Turismo da cidade de Caruaru – traz o rol de patrocinadores dos festejos juninos no Município, com captação de recursos de diversas entidades privadas.
O magistrado alega também que a suspensão do show, programado para ocorrer em uma única data traria prejuízos para todo o comércio local, com possíveis danos à economia local, sobretudo hotéis, bares e restaurantes, além de frustrar a expectativa do público.
A decisão do desembargador apenas autoriza a realização do show antes suspensa, mas não termina ação popular, que deve prosseguir, até para que posteriormente se confirme a legitimidade das alegações declinadas no presente agravo, além da possibilidade, caso se verifique qualquer irregularidade lesiva à Administração Pública, de ser proposta ação civil pública de improbidade administrativa contra os eventuais responsáveis.
Abaixo o texto da decisão do Desembargador José Viana Ulisses Filho.
Continua…
Tribunal de Justiça de Pernambuco
Poder Judiciário
Gabinete do Des. José Viana Ulisses Filho
Rua Frei Caneca, s/n, Maurício de Nassau, CARUARU – PE – CEP: 55012-330 – F:( )
Processo nº 0000133-04.2016.8.17.9000
AGRAVANTE: JOSE QUEIROZ DE LIMA
AGRAVADO: ANGELO DIMITRE BEZERRA ALMEIDA DA SILVA, MARCELO AUGUSTO RODRIGUES DA SILVA
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
1. Trata-se de agravo de instrumento em face de decisão proferida inaudita altera parte em ação popular que determinou a suspensão de show do cantor “Wesley Safadão”, programado para se realizar no próximo dia 25.06.2016.
O juízo de primeiro grau aceitou a alegação dos requerentes de que o valor a ser pago pelo referido show – R$ 575.000,00 (quinhentos e setenta e cinco mil reais) – era excessivo se cotejado com o valor pago pelo mesmo show em outros municípios.
2. Nas suas razões de agravo, requer liminarmente o agravante a suspensão da decisão recorrida.
No mérito, pleiteia a anulação da decisão interlocutória por não haver qualquer irregularidade na contratação do show.
É o relatório. Decido.
3. De início, causa espécie, no presente caso, a discrepância entre o preço do show objeto da lide neste Município de Caruaru e aquele alegadamente estabelecido para o Município de Campina Grande, de R$ 195.000,00 (cento e noventa e cinco mil reais). Trata-se de cidades com perfis semelhantes, em que a festa de São João tem a mesma importância cultural e popularidade.
Diante dessa disparidade, foi proposta a ação popular, visando, nos termos do art. 5º, LXXIII, e da Lei 4.717/1965 (Lei da ação popular), em defesa do patrimônio público municipal.
Observe-se que o art. 1º, §1º, da Lei da ação popular define o patrimônio público, para fins de defesa pelo instrumento processual da ação popular, os bens e direitos de valor econômico, razão pela qual perfeitamente cabível no presente caso, em que visam os requerentes a preservação do erário público municipal.
4. Aduz o agravante, entretanto, que, a despeito de ser efetivamente de R$ 575.000,00 o valor do contrato estabelecido com o Município de Caruaru, justifica-se a magnitude desse valor por não haver, no caso (diferentemente do que ocorre em outros municípios), participação do cantor nos lucros da bilheteria, já que não será cobrado ingresso dos espectadores.
Traz também aos autos o agravante declaração da empresa responsável pela promoção do show, em que se afirma não haver contrato estabelecido entre o cantor e o Município de Campina Grande, existindo somente especulação dos canais de notícias acerca da existência do referido contrato, com valor de R$ 195.000,00 (cento e noventa e cinco mil reais).
Também restou comprovado que, ao contrário do que se afirma na ação popular, a origem dos recursos não é o erário público municipal. O doc. nº 1150849 – ofício exarado pela Fundação de Cultura e Turismo da cidade de Caruaru – traz rol de patrocinadores dos festejos juninos no Município, com a captação de recursos de diversas entidades privadas.
5. O art. 300, § 3º, do Código de Processo Civil preceitua:
§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Trata o dispositivo transcrito do que a doutrina classifica como periculum in morainverso. O dispositivo do Diploma processual é aplicável à ação popular por previsão expressa no art. 22 da já mencionada Lei da ação popular, verbis:
Art. 22. Aplicam-se à ação popular as regras do Código de Processo Civil, naquilo em que não contrariem os dispositivos desta lei, nem a natureza específica da ação.
O periculum in mora é o perigo da demora ocasionado por eventual demora na prestação da tutela jurisdicional. É, juntamente com o fumus boni iuris, pressuposto para a concessão da tutela provisória, nos casos em que aguardar-se o julgamento com cognição exauriente da lide trariam prejuízos irreparáveis ao direito da parte requerente.
Há casos, no entanto, em que o perigo da demora é inverso. São casos em que não há possibilidade de se reverter a medida concessiva da tutela provisória.
É o caso dos autos, em que a suspensão do show, programado para ocorrer em uma única data, traria prejuízos para todo o comércio local, com possíveis danos à economia local, sobretudo hotéis, bares e restaurantes, além de frustrar a expectativa do público.
Frise-se que essa conclusão somente é possível por ter comprovado o agravante não haver, no caso, dispêndio de verba pública para o pagamento do cantor. Caso contrário, seria por óbvio priorizado o interesse público, com a manutenção da suspensão do show para se evitar o gasto de uma verba tão vultosa em um Município, como é Caruaru, no qual a saúde e a segurança pública, o saneamento básico encontram-se em níveis de precariedade extremamente preocupantes.
A incidência da Chikungunya, por exemplo, é notoriamente alta no Município, pela quantidade de mosquitos e muriçocas, cujo principal nascedouro é o rio local – rio Ipojuca. O valor despendido com o show certamente já permitiria limpar o leito do rio e reduzir a quantidade dos insetos que transmitem a doença.
Em suma, o valor a ser pago pelo show, se de verba pública se tratasse e fosse empregada em políticas públicas, não solucionaria todos os problemas do município, mas já mitigaria alguns dos graves males de que padecem os habitantes.
Diante da comprovação de que os recursos utilizados para o pagamento do show objeto da lide estão fora do orçamento do erário municipal, impõe-se a autorização para a sua realização.
6. Com essas considerações, defiro o pedido liminar para suspender, até que seja proferida decisão neste recurso de agravo, os efeitos da decisão agravada.
Advirta-se que a presente decisão apenas autoriza a realização do show antes suspensa, mas não macula a ação popular, que deve prosseguir, até para que posteriormente se confirme a legitimidade das alegações declinadas no presente agravo, além da possibilidade, caso se verifique qualquer irregularidade lesiva à Administração Pública, de ser proposta ação civil pública de improbidade administrativa contra os eventuais responsáveis.
Intime-se a parte agravada para, querendo, oferecer contrarrazões, no prazo legal.
Intime-se também, nos termos do art. 178 do CPC, o Ministério Público para, querendo, intervir no feito, na condição de fiscal da ordem jurídica.
Caruaru, 22.06.2016
Des. José Viana Ulisses Filho
Relator
(Mário Flávio)