g1 – Com a disparada da inflação, a tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) chegou a 31,3% só no governo de Jair Bolsonaro, de acordo com cálculos realizados pelo Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco) a pedido do G1. O estudo leva em conta a inflação medida pelo IPCA no acumulado de janeiro de 2019 até junho deste ano.
A última correção da tabela foi realizada em 2015 e o aumento da defasagem tem aumentado a tributação dos mais pobres e obrigado a cada ano um número maior de brasileiros a pagar imposto de renda.
O levantamento da Unafisco mostra também que, de 1996 a junho de 2022, a defasagem acumulada da tabela do IR das pessoas físicas é de 147,4%. No começo do ano, estava em 134,5%.
A atualização da tabela foi uma promessa da campanha de 2018 de Bolsonaro, mas não foi cumprida. O então candidato defendeu também isenção para quem ganha até 5 salários mínimos. A mudança no IR agora virou promessa para 2023. Nesta semana, o presidente disse que a correção para o próximo ano já foi acertada com o ministro da Economia, Paulo Guedes, mas não foram antecipados detalhes.
Corrigindo a tabela apenas pela defasagem acumulada desde 2019, a faixa de isenção passaria dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 2.500,44. Se houvesse correção de toda a defasagem acumulada, a isenção seria aplicada a quem ganha até R$ 4.710,49 mensais. (Veja mais abaixo simulação dos auditores que mostra como ficaria a tabela com as correções integral e parcial).
Procurado pelo g1, o Ministério da Economia informou que não vai se manifestar sobre a defasagem e atualização da tabela do Imposto de Renda.
Aumento da carga tributária e ‘arrecadação indevida’
Na prática, a não correção da tabela representa um aumento da carga tributária para a população. Isso porque a defasagem faz com que muitos contribuintes deixem de ser isentos ou passem a pagar uma alíquota maior em relação ao ano anterior, uma vez que reajustes salariais (ainda que abaixo da inflação) podem fazer com que a pessoa entre em outra faixa de renda da tabela.
“É um aumento brutal da carga tributária para a classe média e para os pobres e um descumprimento da promessa de campanha de não ter aumento de imposto”, afirma o presidente da Unafisco Nacional, Mauro Silva.
“Para que nunca tivesse ocorrido aumento de imposto de renda na gestão Bolsonaro, desde o primeiro mês de governo deveria ter sido reajustado a tabela pela inflação do ano anterior (2018) e assim sucessivamente nos anos seguintes. Isso pode ser feito por meio de medida provisória”, afirmam os auditores no estudo.
O número de declarações recebidas neste ano pela Receita Federal subiu para 36,3 milhões, um novo recorde histórico, superando o total do ano passado em 2,154 milhões, o que representa um aumento anual de 6,3%.
Número de isentos aumentaria em mais de 5 milhões com correção
O número de contribuintes isentos do Imposto de Renda ao menos triplicaria se a tabela da base de cálculo fosse corrigida integralmente pela inflação acumulada nos últimos anos, de acordo com as estimativas dos auditores.
Segundo a Unafisco, o número de isentos passaria de 7,6 milhões para 13,1 milhões (5,5 milhões a mais) com uma correção da defasagem acumulada na gestão Bolsonaro, podendo chegar a 23,8 milhões (16,2 milhões a mais) com um ajuste integral da tabela, de 147,4%.
Impacto fiscal da perda de arrecadação
Apesar do impacto de uma correção da tabela nas contas públicas, a avaliação dos auditores é que se trata de uma questão de justiça tributária, uma vez que se trataria de uma arrecadação indevida.
“Cada 1% de inflação não recuperada na tabela equivale a R$ 2 bilhões a mais de arrecadação indevida”, diz Silva.
O levantamento da Unafisco mostra que uma correção parcial de 31,3% da tabela do IR faria a arrecadação federal com o imposto cair para R$ 250 bilhões, o que representaria um impacto fiscal da ordem de R$ 63 bilhões para o governo federal.
Em junho do ano passado, o governo enviou uma proposta de correção parcial da tabela para o Congresso como parte da reforma tributária. A proposta chegou a ser aprovada pela Câmara dos Deputados, mas segue paralisada no Senado. Pouco se avançou também nas discussões sobre a revisão e simplificação do sistema tributário brasileiro.
O Brasil é um dos poucos países, atualmente, que não taxam a distribuição de lucros e dividendos para pessoas físicas, que vigorou até 1995 e foi extinta. Analistas avaliam que, ao taxar pouco a renda e o patrimônio, e muito o consumo — na comparação com outros países —, o sistema tributário brasileiro penaliza a parcela mais pobre da população e beneficia os muito ricos.