Luana Patriolino e Raphael Felice/Correio Braziliense
O flerte entre o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva corre o risco de não se concretizar numa chapa para as eleições deste ano. O ponto de discórdia está no fato de o petista e de outras lideranças do partido defenderem a revogação da reforma trabalhista, em vigência desde o governo Michel Temer.
A intenção da cúpula do PT pode afastar Lula do centro político. Diante da situação, Alckmin demonstrou preocupação com o posicionamento do ex-presidente e já conversa com outras legendas sobre o seu futuro. Ao mesmo tempo, adversários de Lula levantam temor de mudanças bruscas na política econômica num eventual governo do PT.
O plano de Lula se aproximar de políticos e partidos fora da esquerda faz parte de uma estratégia para tentar liquidar as próximas eleições ainda no primeiro turno, possibilidade mostrada em pesquisas eleitorais. No entanto, nos últimos dias, integrantes do PT, como a presidente do partido, deputada Gleisi Hoffmann (PR), defenderam nas redes sociais a completa revogação da reforma trabalhista.
“Está na hora de revogar o que deu errado: Lei do Teto, a reforma que não gerou empregos, política de preços dos combustíveis. Deter a privatização selvagem e rever os contratos lesivos ao país”, declarou a parlamentar.
A preocupação com esses temas foi expressada por Alckmin ao presidente do Solidariedade, Paulinho da Força, durante café da manhã entre os dois ontem, na capital paulista. O sindicalista aproveitou a ocasião para convidar o ex-tucano a se filiar à legenda. Segundo o político, o tema já tinha sido abordado antes e, agora, “é só aguardar”.
Equívoco
Na avaliação do cientista político André César, Lula se equivocou ao colocar em discussão a reforma trabalhista neste momento. “Eu acho que é um erro crasso, por conta da história do Lula. Ele colocou na mesa um tema complicado e polêmico e que não estava em pauta. A mídia reagiu, o mercado reagiu e os adversários, também”, frisou.
Para César, Alckmin pode fazer alianças mais estáveis, caso queira disputar algum cargo no pleito deste ano. “O partido mais ‘natural’ depois que ele saiu do PSDB, seria o PSD, de Gilberto Kassab. Para Alckmin, é uma legenda muito mais interessante, que tem um guarda-chuva muito maior, que tem estrutura e pretensões fortes”, observou.
Já o advogado trabalhista e professor de direito do trabalho do Centro Universitário de Brasília (Ceub) Claudio Santos entende que a reforma tem pontos positivos, mas não entregou o seu principal objetivo: geração de empregos. “Não facilitou a criação, não gerou novos contratos. Por mais que a economia não tenha ajudado, a reforma não cumpriu a missão que ela queria, que era diminuir o desemprego”, apontou.
O especialista citou aspectos positivos da legislação, como o trabalhador poder escolher como vai tirar as férias e negociar as horas extras, mas frisou que a revogação de tudo que foi feito em 2017 pode ser positiva para o mercado. “Nesse caso, as leis trabalhistas se enquadrariam ao que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) entende como positivo para o trabalhador e fortaleceria os direitos coletivos”, concluiu.
A possibilidade de aliança entre Lula e Alckmin provocou críticas nas alas mais radicais da esquerda e dos eleitores da chamada centro-direita. Isso porque os dois políticos já tiveram desavenças e teriam agendas conflitantes em relação às demandas do país.
Para o cientista político Leonardo Queiroz Leite, doutor em administração pública e governo pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP), o comportamento dos políticos demonstra uma espécie de promoção pessoal. “Eles foram adversários e, em certo momento, eu diria até que foram inimigos. É uma incoerência muito grande, porque são adversários históricos. Então, vai ser difícil não passar uma imagem de oportunismo se unindo àqueles que sempre combateram”, enfatizou.