Por Magno Martins – A visita de Luiz Inácio Lula da Silva a Pernambuco nesta semana causou uma saia justa ao ex-presidente, que assistiu ao vivo às vaias e à rejeição de grande parte dos seus eleitores ao nome do deputado federal Danilo Cabral (PSB), que concorrerá ao governo de Pernambuco com apoio do PT.
Especialistas ouvidos pela coluna afirmam que a resistência ao nome de Danilo tem a ver com a grande rejeição ao governador Paulo Câmara (PSB), ao apoio do socialista ao impeachment de Dilma Rousseff e à maior identificação histórica de Marília com Lula e causas defendidas pela esquerda. As informações são de Carlos Madeiro, colunista do UOL.
Lula fez um tour por três regiões do estado (Agreste, Sertão e Litoral) e, em todas, ouviu vaias a Danilo. Ecoaram gritos por Marília Arraes (SD), que saiu do PT em março, após ter seu nome vetado para disputar o governo.
Marília lidera as pesquisas até aqui com folga, com quase três vezes mais intenções de voto do que Danilo. No levantamento Ipespe de 4 de julho, ela apareceu com 29%, e Danilo com 10% (na quarta colocação).
Ex-petista, Marília tem um histórico ao lado de Lula. Em 2020, concorreu à Prefeitura do Recife pelo PT contra João Campos (PSB), numa campanha marcada pelo uso do antipetismo para derrotá-la. Ela diz que entende alianças que o PT precisa fazer para criar uma frente ampla.
Correligionários dela já se apropriaram até do jingle do ex-presidente e cantam que é “Lula lá, Marília cá”. Já a campanha de Danilo criou o termo “DaniLula” para cravar o voto casado.
Lula e o acordo com o PSB
O acordo do apoio do PT ao PSB em Pernambuco faz parte da grande aliança nacional dos partidos, que lançou a chapa Lula-Alckmin para a eleição presidencial.
Como o PSB é comandado há muitos anos por gente do diretório pernambucano, o apoio de Lula ao partido ao estado foi um ponto-chave. Lula chegou a dizer que estava em Pernambuco para cumprir “sua parte do acordo”.
“Eu quero cumprir o compromisso com o PSB e quero que o PSB cumpra o compromisso com o PT. Porque, se a gente não fizer assim, a gente não cria base para construir uma coalizão capaz de ensinar a sociedade brasileira a conviver democraticamente na adversidade”, declarou o petista em Garanhuns, na quarta-feira, ao dizer que separava relações pessoais das políticas.
Apesar da fala, Lula não conteve as vaias a Danilo e ainda ouviu gritos de “Marília” de parte do público.
No Recife (onde está a base de Marília), a situação foi ainda mais constrangedora, com gritos mais forte repetidos de “Marília”. Na fala de Danilo, Lula levantou-se no palco para tentar amenizar as vaias. Ainda na capital, ouviu-se até gritos de “golpista” direcionados ao socialista.
Após Lula defender a pré-candidatura de Danilo Cabral, Marília disse lamentar que o PSB tenha submetido o ex-presidente a “tamanho constrangimento”.
“Ainda é cedo para fazer uma análise da visita de Lula; veremos esse impacto apenas nos próximos dias”, diz o cientista político Adriano Oliveira, professor da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e fundador da consultoria Cenário Inteligência.
Entretanto, ele vê que a imagem de Lula com Danilo pode causar impacto positivo entre os eleitores lulilstas, mas é necessário convencer o eleitor hoje com Marília de que eles são diferentes.
“Uma coisa é certa: Danilo terá de encontrar um discurso que o diferencie de Marília para relacionar seu nome ao de Lula. Se vai conseguir ou não, ainda veremos”, diz.
Rejeição ao governador vai para Danilo
A rejeição a Danilo teria relação direta com a desaprovação à gestão de Paulo Câmara (PSB). De acordo com o último levantamento do Instituto Paraná Pesquisas, de junho, a gestão estadual era desaprovada por 67,3% dos entrevistados. Ele inclusive foi o mais vaiado entre todos os presentes ao evento em Garanhuns.
“Danilo tem que se mostrar legatário de um governo que é reprovado na opinião pública. Então esse é um ponto de desafio ao PSB aqui em Pernambuco”, diz o cientista político Arthur Leandro, da UFPE.
Ele cita que a dificuldade para associar o nome de Danilo Cabral à figura de Lula ocorre porque o deputado federal “não é uma liderança popular e não tem penetração junto à militância de esquerda”. “Ele é aquilo que a literatura política chama de quadro partidário”, afirma.
“Estamos em momento da política em que o eleitorado se identifica com as lideranças carismáticas. Lula e Bolsonaro são mais do que Lula e Bolsonaro agora: representam duas visões sobre o Brasil que estão em conflito. A polarização é o reflexo de um processo social mais profundo. Não existe muito espaço para nomes técnicos nessa eleição”, diz Arthur Leandro, da UFPE.
Sobre as vaias a Danilo, Leandro diz que os apelos de Lula não devem fazer efeito entre o público mais ideológico à esquerda (que é o que costuma ir aos eventos com Lula), mas deve ter impacto entre as pessoas que têm um voto não ideológico.
“Aquela parcela do eleitorado que tem uma memória afetiva do período de Lula deve ser mais suscetível à imagem de Lula e Danilo juntos”, diz, citando que mesmo assim vê Danilo em uma situação complicada para chegar ao segundo turno.
” Acho que a visita de Lula trará um efeito discreto no resultado final da votação. A gente tem cinco candidatos competitivos, certamente vai ter segundo turno em Pernambuco. E aí vejo Marília bem-posicionada nesse cenário, com o provável apoio de Lula no segundo turno”, finaliza.
Campanha pode ajudar
Para o cientista político e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco Túlio Velho Barreto, a candidatura de Danilo Cabral tende a crescer com o apoio público do ex-presidente Lula, especialmente quando a propaganda política no rádio e na TV começar.
Porém, Barreto diz que as manifestações contrárias ocorridas na visita de Lula ao estado deixaram clara a rejeição ao nome de Danilo Cabral por parte da militância petista. “Acho [essa rejeição] um fator muito relevante e que nem o ex-presidente conseguirá conter. Os eleitores e as eleitoras de Lula tenderão a separar as eleições estadual e nacional. A rejeição [nos atos] escancara que Danilo terá limites para crescer”, diz.
O empecilho para Danilo, avalia, vem da própria história dele e do PSB nos últimos anos em relação ao PT. “Vimos como foram as eleições para a Prefeitura do Recife e o apoio da legenda ao afastamento da presidenta Dilma Rousseff —com o voto de Danilo na sessão de forma até mesmo virulenta. Então, parece ser uma decisão racional: ‘Voto no Lula e dou meu voto a quem identifico mais com o próprio Lula’”, explica.
Sobre o impeachment, Danilo disse, em entrevista ao UOL, que era assunto superado, porque ele e o PSB reconheceram o “erro histórico”. Procurado pela coluna, o PSB não indicou ninguém para falar sobre as reações do público contra socialistas durante a visita de Lula.