Para 70% dos brasileiros, há corrupção no governo Bolsonaro, diz Datafolha

FolhaPress
Presidente eleito sobre uma plataforma de tolerância zero com malfeitos administrativos, Jair Bolsonaro (sem partido) não convence os brasileiros neste quesito: para 70% dos eleitores entrevistados pelo Datafolha, há corrupção em seu governo.
A percepção é amplificada pelas suspeitas de irregularidades em contratos do Ministério da Saúde, colocadas à luz pela CPI da Covid. Entre os entrevistados pelo instituto, acham que há corrupção na pasta 63%, e que o presidente sabia dela, 64%.
Os dados foram colhidos pelo Datafolha ao entrevistar 2.074 pessoas com mais de 16 anos, nos dias 7 e 8 de julho. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou menos.
Segundo o instituto, os grupos que mais veem corrupção na gestão Bolsonaro são mulheres (74%), jovens (78%), moradores do Nordeste (78%) e, claro, aqueles que reprovam a atual administração do governo federal (92%).
São estratos semelhantes em sua avaliação negativa do presidente da República em diversos itens coletados pelo Datafolha nesta pesquisa. O presidente está com seu maior índice geral de reprovação, 51%, e 52% dos ouvidos o consideram desonesto -invertendo a impressão colhida em junho de 2020, há pouco mais de um ano, portanto.
O único grupo pesquisado em que a opinião negativa sobre corrupção não é majoritária é o dos empresários (2% dos ouvidos), no qual 50% creem haver malfeitos no governo, tecnicamente empatados com os 48% que discordam.
Já aqueles que acham que não há corrupção no governo perfazem 23% da amostra. Aqui, a crença na probidade da gestão é maior entre homens (28%), pessoas com mais de 60 anos (29%), e os nichos de eleitores evangélicos (30%) e de moradores de Norte e Centro-Oeste (31%).
Por óbvio, a taxa dispara entre os que aprovam o governo (60%) e os que confiam na palavra do presidente (74%). No cômputo geral, contudo, o primeiro grupo soma 24% e o segundo, 15%.
A apuração de irregularidades na venda de vacinas ao governo federal tem dominado o noticiário nas últimas semanas e chegou ao presidente, que viu ser aberto um inquérito pelo Supremo Tribunal Federal para investigar se ele prevaricou no caso.
A suspeita sobre a compra de imunizantes veio à tona em torno da negociação da vacina indiana Covaxin, quando a Folha revelou em 18 de junho o teor do depoimento sigiloso do servidor da Saúde Luis Ricardo Miranda ao Ministério Público Federal (MPF), que relatou pressão “atípica” para liberar a importação de doses do imunizante indiano.
Desde então, o caso virou prioridade da CPI. A comissão suspeita do contrato para a aquisição da vacina por ter sido fechado em tempo recorde, em um momento em que a Covaxin ainda não tinha todos os dados de ensaios clínicos divulgados, e por prever o maior valor por dose, em torno de R$ 80 (ou US$ 15 a dose).
Meses antes, o ministério já tinha negado propostas de vacinas mais baratas do que a Covaxin e já aprovadas em outros países, como a Pfizer (que custava US$ 10).
A crise chegou ao Palácio do Planalto após o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), irmão do servidor da Saúde, relatar que o presidente havia sido alertado por eles em março sobre irregularidades.
Bolsonaro teria respondido, segundo o parlamentar, que iria acionar a Polícia Federal para que abrisse uma investigação. A CPI, no entanto, constatou que não houve solicitações nesse sentido. O Ministério da Saúde suspendeu o contrato após a
Folha revelar o teor do depoimento de Ricardo Miranda ao MPF.
Ainda segundo o relato do deputado, Bolsonaro teria dito a ele e ao irmão que o problema no ministério era um “rolo” do seu líder na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).
O acusado nega, mas o presidente nunca negou o episódio –questionado por carta pela CPI da Covid sobre isso, usou termos chulos para dizer que não responderia.
A partir do caso Covaxin, a Folha chegou a outro caso de suspeitas de irregularidades envolvendo a Davati Medical Supply. A reportagem localizou Luiz Paulo Dominghetti Pereira, que se apresentou como vendedor da empresa.
À Folha ele disse que o então diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, cobrou propina de US$ 1 por dose de vacina para fechar contrato. As acusações foram repetidas em depoimento à CPI da Covid. Dias foi exonerado em seguida.
Tal comportamento encontra eco na opinião pública. Para 63%, há corrupção na Saúde, ante 25% que a descartam e 12% que não sabem. A visão é mais sustentada por quem tem curso superior (68%).
Mais importante, 64% dos entrevistados acreditam que Bolsonaro sabia dos problemas, justamente o que o inquérito busca esclarecer. Outros 25% não creem nisso e 11%, não opinaram.
São mais crentes no conhecimento presidencial os jovens de 16 a 24 anos (72%) e os nordestinos (71%), repetindo o padrão crítico de outros itens desse levantamento. Já acreditam mais em que Bolsonaro nada sabia aqueles que ganham entre 5 e 10 salários mínimos (36%) e os empresários (44%).
O Datafolha também questionou acerca do conhecimento específico dos casos. Aí, 70% dos ouvidos disseram estar informados sobre eles, 22% bem, 34% mais ou menos e 9%, mal.
Nesse grupo, a taxa de quem acha que havia corrupção sobe para 77%, e chega a 85% entre aqueles que acham que Bolsonaro sabia. No geral, dentro daqueles que conhecem os casos, 74% avaliam que o presidente tinha conhecimento de tudo.
Já as pessoas que dizem confiar mais em Bolsonaro são majoritariamente aderentes da tese de que ele nada sabia dos malfeitos (71%). Na mão inversa, aqueles que defendem o impeachment do presidente (54% na amostra total) são quase unânimes (89%) em achar o contrário.
Apesar da percepção negativa e a chegada do tema aos protestos de rua, a expectativa de que haverá aumento nos casos de corrupção no governo caiu ante a pesquisa anterior na qual a pergunta foi feita, em 15 e 16 de março. Acham que o problema vai crescer 56%, ante 67% há quatro meses.
A opinião é espraiada pelos vários grupos socioeconômicos da amostra. Os que avaliam que a corrupção vai se manter nos níveis atuais oscilaram de 23% para 26%, com uma crença maior entre os mais ricos: 44% acham isso.
Para 13%, haverá menos irregularidades, ante 8% em março. Aqui, os que ganham de 5 a 10 salários mínimos são os mais otimistas (22%). Não souberam opinar 5% (3% no levantamento passado).