Por João Batista Rodrigues*/ Blog do Magno – Apesar de todas as críticas feitas a liminar concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Roberto Barroso, suspendendo o piso dos profissionais de enfermagem, esta pode ser a única chance de efetividade da Lei 14.434/2022 que fixou o pagamento mensal mínimo as enfermeiras (os) no valor mínimo de R$ 4.750,00.
Infelizmente, no Brasil, a criação de uma lei não significa efetivo cumprimento, existe uma péssima cultura que separa a legislação entre “lei que pega e lei que não pega”, e a lei do piso precisa pegar. É preciso valorizar os profissionais de enfermagem porque são eles, principalmente técnicos e auxiliares, que, verdadeiramente, tocam hospitais e serviços de saúde, cuidando dos enfermos, enfrentando o perigo de viagens em ambulâncias sem a devida manutenção, expondo a própria saúde num ambiente de alto risco de contaminação.
Não há como negar a necessidade urgente de um salário digno para categoria, além de melhores condições de trabalho, pelo bem de todos. Contudo, infelizmente, a lei do piso pela maneira como foi aprovada tinha tudo para “não pegar”.
Nossos parlamentares, que já deveriam ter discutido e votado um piso para os profissionais de enfermagem há anos, aprovaram uma lei no calor das urnas, deixando o principal para depois, se omitindo em definir a fonte de custeio. Só criança querendo brinquedo é que não se importa de onde vem o dinheiro para pagar, no caso, o brinquedo são os votos da categoria.
O processo legislativo se completou com a sanção presidencial, também sob a influência das urnas, uma vez que fora do período eleitoral o Deputado Eduardo Bolsonaro havia votado contra e o próprio Presidente demonstrou preocupação com o impacto financeiro de outra luta da categoria que é a caga horária de trinta horas semanais. A fonte de custeio não foi definida também pelo Presidente, nem sequer foi cogitado um aumento da tabela SUS ou um financiamento de apoio para os municípios.
Dessa forma a lei tem dificuldades imensas para ser efetivada. O próprio Ministro do STF, Luís Roberto Barroso declarou que havia “um risco real e iminente de descumprimento geral” e que “muitos hospitais estavam demitindo trabalhadores de forma antecipada por dificuldades em cumprir com o pagamento do salário definido. As Santas Casas, se conseguissem não fechar, já acenavam com redução dos serviços que iriam prestar. Os hospitais conveniados do SUS acenavam com demissões em massa. E os serviços de saúde corriam o risco de ficar prejudicados, sobretudo os de diálise que, como sabem, são indispensáveis para preservação da vida de muitas pessoas”.
Pois bem, veio a liminar no domingo (04) e já na terça (06) o Presidente do Senado Rodrigo Pacheco, um homem ponderado, também da área do direito, esteve em audiência com o Ministro e iniciou um processo de apontamento das fontes de custeio para o estimado piso da enfermagem.
Depois da reunião, Pacheco afirmou que a atualização da tabela do SUS é o caminho para viabilizar o piso salarial da enfermagem (Poder 360). Também foi ventilado o perdão de dívidas do estado e a desoneração da folha de pagamento dos hospitais como formas de viabilizar o piso salarial.
No mesmo dia, o Ministro também se encontrou com a deputada Carmen Zanotto, relatora do projeto que originou a lei do piso, e a congressista declarou que “espera um “esforço concentrado” da Câmara, do Senado e da equipe econômica do governo para definir as fontes de custeio” (Poder360), ou seja, depois da liminar, o esforço para definir o que teria que ser feito de maneira responsável antes da aprovação. Esperamos que neste esforço, se encontre também formas de apoiar os municípios para poderem pagar o piso.
Na quinta (15), quando em plenário virtual o STF formou maioria pela suspensão do piso até que os poderes prestem os esclarecimentos necessários (forma de custeio e impacto orçamentário), o Presidente do Senado declarou em suas redes sociais: “diante da decisão colegiada do STF, cabe-nos agora apresentar os projetos para garantir a fonte de custeio a estados, municípios, hospitais filantrópicos e privados. Até segunda-feira apresentaremos as soluções possíveis”, chamando para si a responsabilidade.
E de fato, ontem (segunda, 19) foram apresentadas as primeiras soluções para o custeio do piso. Dentre as várias proposições legislativas (PLP 44/2022, PL 798/2021, PL 458/2021, PL 1.417/2021) foram propostas soluções que transferem recursos para a saúde ou autorizam o uso de recursos diversos para adequação ao piso. O PLP 1.417, por exemplo, autoriza auxílio financeiro da União para as santas casas e hospitais filantrópicos sem fins lucrativo, com benefício estimado em R$ 3,34 bilhões.
Palmas para Rodrigo Pacheco, mas é uma pena que a parte mais importante da discursão, fontes de custeio, sobre uma lei tão significativa para a saúde dos brasileiros só seja efetivada após a sanção, causando enorme desconforto social.
As proposições salvadoras são anteriores a aprovação do piso, mas só entraram na pauta após a liminar do Ministro Barroso que dessa forma acabou sendo o freio de arrumação na irresponsabilidade inicial do congresso e do executivo. Temos agora chances reais da lei do piso da enfermagem pegar, tem que pegar.
*Advogado, ex-prefeito de Triunfo, Ex-presidente da União dos Vereadores de Pernambuco – UVP, secretário da Comissão de direito Municipal da OAB/PE.