Mesmo após condenação, Valdemar ainda dá cartas no PR…

Bruno Góes – Globo

Condenado em 2013 a sete anos e dez meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no escândalo do mensalão, Valdemar Costa Neto ainda dá as cartas no PR, partido ao qual, no papel, não é mais filiado. Comandante de uma bancada de 40 deputados, é ele quem centraliza indicações políticas e decide o rumo das alianças da legenda.

A única ligação formal de Valdemar com o PR é ser funcionário administrativo. Numa sala em Brasília, recebe aliados discretamente. O chefe do PR mora em São Paulo, chega invariavelmente segunda-feira à noite em Brasília e deixa a cidade na quinta-feira. Poderia ser a rotina de um parlamentar, mas trata-se do dia a dia de um personagem que se move nas sombras e tem aversão a qualquer publicidade.

Em atitude incomum, Valdemar esteve numa grande reunião realizada na quarta-feira da semana passada com partidos do blocão, que têm se reunido para discutir as eleições. Normalmente, Valdemar evita locais com muitos líderes políticos, pois teme o estardalhaço. Ao ir à casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), fez um aceno a representantes de DEM, PP, PRB, SD PSC e PHS.

Relatou que, até a semana passada, seu partido tinha como certa a aliança com Jair Bolsonaro (PSL), pré-candidato à Presidência. E tratou de dizer que o panorama havia mudado. O chefe do PR chegou a recusar uma conversa com Geraldo Alckmin há duas semanas, mas jamais deixou de operar nos bastidores.

— O problema de apoiar o Bolsonaro é que todas as pesquisas indicam que ele perde no segundo. Aí, sabe como é… É muito difícil para o Valdemar ser oposição — disse um dos caciques que estiveram presentes à reunião.

Valdemar tem total controle do partido, mesmo sendo, no papel, um mero funcionário sem mandato parlamentar.

— Outro dia até mexemos com ele. “Olha, você precisa tirar férias” — disse um assessor de Valdemar.

Continua…

Desequilíbrio do “pessoal de Mogi”

Ele tirou férias, mas não descansou. Alguns parlamentares até tentaram espalhar a versão de que o partido está mais democrático, mas a realidade indica o contrário. Segundo um funcionário que trabalha há mais de dez anos no PR, Valdemar sempre foi muito cioso de manter o poder no partido.

— O “pessoal de Mogi” (Mogi das Cruzes, base eleitoral de Valdemar) desequilibra qualquer resultado de convenção ou decisão nacional. Pode juntar quantos deputados você quiser, que eles não vão chegar a ter o controle que ele tem. Mas não precisa disso. O Valdemar agrada a todo mundo — conta um aliado no PR.

No dia 13 de junho, Valdemar teve um encontro com o presidente Michel Temer. No Planalto, segundo um aliado, tratou da situação da afilhada política Deusdina dos Reis Pereira, ex-vice-presidente da Caixa, acusada de tráfico de influência por negociar cargo em uma estatal como moeda de troca para liberação de crédito.

Por ter ocupado o cargo por indicação do PR, Valdemar se sentiu na obrigação de defendê-la. A servidora não foi reconduzida a uma vice-presidência, mas retornou aos quadros da Caixa.

Antes de ser condenado no mensalão, Valdemar organizou a vida nos mínimos detalhes. Devido aos cuidados, não há registro de foto sua sendo preso. Ele mudou o domicílio com antecedência para cumprir pena onde achou melhor. Um mês antes da condenação, deixara a carta de renúncia com um assessor próximo. Já sabia qual era o uniforme da prisão, para onde ia e como se comportar. Iria submergir nas sombras, sem perder o poder.

Dentro do PR, Valdemar se cacifou ao chamar para si a responsabilidade no episódio do mensalão. Não deixou que nenhum outro deputado fosse responsabilizado. Desde o escândalo, Valdemar raramente fala com a imprensa.

Após o impeachment de Fernando Collor, Valdemar começou a circular nos corredores do poder e a ganhar influência. Ele só foi oposição no governo FH, quando não admitiu perder o controle da Receita Federal do Aeroporto de Guarulhos. No carnaval de 1994, acomodou a modelo Lilian Ramos ao lado do então presidente Itamar Franco. Em foto histórica, publicada no GLOBO, Itamar apareceu ao lado da modelo, que estava sem calcinha.

Desde o primeiro governo Lula, dá a palavra final sobre o indicado ao Ministério dos Transportes. Em 2005, contou numa entrevista à revista Época como vendeu o apoio do PL, sigla que antecedeu o PR, na campanha presidencial de Lula em 2002. Foram R$ 6,5 milhões, segundo contou, pagos pelo caixa dois do PT. Com esse acordo, o empresário José de Alencar, filiado ao PL, virou vice de Lula.