“Podemos tomar essa decisão semana que vem ou até dia 30 de maio, porque continuamos negociando com outros laboratórios”, afirmou. O contrato, firmado em 7 de janeiro, prevê um lote de 46 milhões de doses, que serão entregues até o fim de abril. Na última quarta-feira, o diretor do Butantan, Dimas Covas, cobrou uma resposta do governo federal sobre as doses adicionais, ameaçando exportar os imunizantes para países da América Latina se não tivesse um retorno da pasta até o fim desta semana.
Reação
Aliás, a ideia da exportação deu lugar à venda direta para estados e municípios interessados em obter o fármaco, e elevou a pressão sobre o governo federal. Covas afirmou que poderia negociar os 54 milhões de doses dentro do país –– que, de acordo com números do ministério, registrou 221.547 mortos pela covid-19, sendo que 1.386 ocorreram nas últimas 24 horas; os casos são 9.058.687, com 61.811 registrados entre quarta (27/01) e quinta-feira (28/01).
Em mais uma etapa da queda de braço entre os governos de São Paulo e federal, o governador João Doria, que já havia criticado a atitude do governo federal em postergar a intenção de compra, voltou a comentar o assunto. Por meio de uma rede social, disse que caso o ministério não confirme, em breve, a compra do lote de 54 milhões de doses, determinou que o Butantan negocie as vacinas com estados e municípios. “O país tem pressa em salvar vidas. E, nós, em vacinarmos os brasileiros”, publicou.
A nova posição do governo paulista ocorreu depois que o ministério divulgou uma nota chamando de “desconectada da realidade” a possibilidade de exportação do imunizante. “Embora o governo de São Paulo tenha afirmado (…) que vai exportar doses extras da CoronaVac se o governo Jair Bolsonaro não manifestar interesse, e que Dimas Covas, do Instituto Butantan, tenha dito que o ‘Butantan tem compromisso com outros países e que, se o Brasil declinar desses 54 milhões, vamos priorizar demais países com que temos acordo’, tais afirmações são improcedentes, incoerentes, desconectadas da realidade e desprovidas de qualquer amparo legal”, diz o texto.
O ministério voltou a ressaltar a cláusula de exclusividade do contrato, que prevê que “a contratante terá o direito à exclusividade da vacina”, e que o Butantan fica desobrigado apenas se a pasta desistir dos 54 milhões de doses. O ministério ressaltou que não fechou contrato com o Instituto Butantan ou com o governo de São Paulo, mas com a Fundação Butantan, representada no ato legal pelo seu presidente, Rui Curi –– mas, a rigor, as duas instituições trabalham juntas.
Intervalo mantido
Após o governo de São Paulo pedir ao Ministério da Saúde para ampliar o intervalo entre as duas doses da CoronaVac, a fim de imunizar mais pessoas neste primeiro momento, a pasta indicou, ontem, que não vai alterar o tempo entre a primeira e a segunda aplicação da vacina produzida pelo Instituto Butantan. E informou, ontem, que analisava o recebimento do pedido feito pelo governo de São Paulo com a área técnica responsável, mas ressaltou que, até o momento, não há evidências científicas de que o aumento da distância entre as doses oferecerá a proteção necessária à população.
“É importante ressaltar que as recomendações têm como base os estudos clínicos da fase 3 do imunizante, que indicam que o intervalo entre a primeira e a segunda dose deve ser de duas a quatro semanas”, informou o ministério, após ser questionado pelo Correio Braziliense sobre a possibilidade de uma mudança na orientação da aplicação da CoronaVac. A prescrição na bula da vacina, com base nos estudos que foram realizados, é que a segunda injeção seja aplicada em um intervalo de 14 a 28 dias, sendo que a melhor resposta imune é alcançada quando é aplicada entre 21 e 28 dias. A intenção do governo paulista é ampliar esse tempo para 43 dias.
O ministério alegou que, desde 19 de janeiro, alertou ao Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) e ao Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems) que todos os estados “devem cumprir as diretrizes para que o país tenha doses suficientes para imunizar, com as duas doses previstas, este primeiro ciclo da campanha de vacinação”.
Na última quarta-feira, o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse que não havia razão para guardar 50% das doses para a segunda fase da primeira parcela da população imunizada, diante do aumento de casos e de mortes. “Se nós temos a vacina na prateleira, temos, do outro, lado pessoas morrendo. Então, precisamos usar essas vacinas. Não tem justificativa ética guardarmos. É melhor usarmos na totalidade e lá (após) 28, 30, 32, 33, 40 dias, nós providenciarmos a segunda dose”, sugeriu.
Risco embutido
O epidemiologista e professor em saúde coletiva da Universidade de Brasília (UnB) Jonas Brant explicou que a tentativa dos representantes do Butantan, ao defender a ampliação do intervalo entre as doses, se baseia no princípio da “plausibilidade biológica”. Mas alerta: “O fato de não seguir o que o fabricante recomenda coloca um risco em termos de garantia dos resultados divulgados”, observou. Na última sexta-feira, o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Gustavo Mendes, ressaltou que a orientação da autarquia é que se siga o que prevê a bula.