Governadores podem barrar serviços essenciais, como academias? Entenda

Correio Braziliense

Diante da inclusão de academias de ginástica e salões de beleza na lista de serviços essenciais, ou seja, aqueles que podem ser mantidos mesmo durante a pandemia de  coronavírus, especialistas alertam que a liberação não é automática. O decreto, assinado pelo presidente Bolsonaro, foi confirmado no fim da tarde desta segunda-feira (11/5).

Entretanto, por meio de decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), estados e municípios têm o poder e autonomia de estabelecer medidas para o enfrentamento ao coronavírus, inclusive sobre isolamento social, fechamento de comércios e outras restrições.

De acordo com o advogado e especialista em direito constitucional Daniel Falcão, não cabe à União tratar da liberação dos espaços. “Diante do fato de que os estados e o Distrito Federal têm autonomia para tratar desses assuntos de abertura e fechamento de estabelecimentos comerciais, esse decreto da União não precisa ser seguido pelas unidades da Federação”, explica. 

Segundo Falcão é comum as pessoas pensarem que há uma hierarquia entre a União, estados, Distrito Federal e municípios, mas que não é necessariamente assim. “Eles rebatem as competências. Cada um cuida de uma coisa. Às vezes, cuidam juntos também. Mas existe uma separação.”

No caso da decisão do STF, de acordo com Falcão, fica bem claro que cabe a estados e municípios decidirem à respeito da abertura dos comércios. Para exemplificar, ele lembrou também de um caso no Rio Grande do Sul quando Grêmio e Internacional começaram a fazer treinamentos com seus jogadores, porém, o governador impediu a atividade.

Dessa forma, o especialista afirma que não vê qualquer possibilidade desse decreto da União preponderar diante dos estados que queiram que estes estabelecimentos continuem fechados até a situação da pandemia se controlar.

Outro especialista em direito constitucional ouvido pelo Correio, Acácio Miranda da Silva Filho compartilha do mesmo posicionamento. Segundo ele, diante da decisão do Supremo, continua possível o fechamento destes serviços pelos chefes locais. “É possível a manutenção destes estabelecimentos fechados porque é um conflito entre o decreto federal e os decretos estaduais e municipais. E o Supremo já deixou claro que devem prevalecer os estaduais e municipais”, explica.

Outra opinião

Já para Max Kolbe, advogado e professor de direito constitucional, com a edição do decreto presidencial inserindo academias e salões de beleza como serviços essenciais, independentemente de discordâncias ao tema, não cabe a governadores e prefeitos decidirem de modo diverso, sob pena de ofensa a Constituição Federal, lei Federal (art. 3º, parágrafo 9º, da Lei 13.979/20) e ao próprio pacto federativo.

Kolbe argumenta que a Lei nº 13.979/20, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019, compete ao presidente da República, mediante decreto, dispor sobre os serviços públicos e atividades essenciais.

“Assim, ainda que o STF tenha entendido outrora que os estados e municípios podem regulamentar medidas de isolamento social, fechamento de comércio e outras restrições, ressalto considerar que o tema é de competência administrativa comum. O fato é que após a edição do decreto do presidente da República incluindo, nos termos da lei federal, academias e salões de beleza como serviços essenciais, não pode mais governadores e prefeitos decidir de modo diverso, sob pena de contrariarem a lei”, defende.

Para ele, mesmo com a decisão do SFT de dar autonomia aos governadores e municípios, não se poder deixar de lembrar que decreto não é lei e, que segundo o art. 24, § 4º, da Constituição Federal, o efeito de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário. “Devendo esse dispositivo constitucional ser levado em consideração em caso de eventual discussão judicial quanto ao tema”, conclui.