Ferreira Gullar: “Não há vagas”…

O jornalista, crítico de arte, teatrólogo, biógrafo, tradutor, memorialista, ensaísta e poeta maranhense José Ribamar Ferreira, o famoso Ferreira Gullar, explica por que “Não Há Vagas” para os dramas diários.

 

NÃO HÁ VAGAS

Ferreira Gullar

 

O preço do feijão

não cabe no poema.

O preço do arroz

não cabe no poema.

Não cabem no poema o gás

a luz o telefone

a sonegação

do leite

da carne

do açúcar

do pão.

 

O funcionário público

não cabe no poema

com seu salário de fome

sua vida fechada

em arquivos.

Como não cabe no poema

o operário

que esmerilha seu dia de aço

e carvão

nas oficinas escuras.

 

– porque o poema, senhores,

está fechado: “não há vagas”

Só cabe no poema

o homem sem estômago

a mulher de nuvens

a fruta sem preço

 

O poema, senhores,

não fede

nem cheira.