Por maior que sejam as críticas ao governo de Jair Bolsonaro (PSL), a atuação do presidente da República está seguindo quase à risca suas declarações e promessas de campanha. Alinhado as ideias de extrema direita, o estadista não abdicou de discursos contra supostas ideologias de esquerdas que, segundo ele, estão enraizadas na política e cultura brasileira. Narrativa também utilizada pelos seus auxiliares que se alimentam do repúdio ao “marxismo cultural”, conceito bastante controverso dito pelo guru Olavo de Carvalho.
É preciso ressaltar que existem várias vertentes de esquerda e direita no mundo. São denominações que se adequam a realidade de cada país ou região e fazem parte da pluralidade política tão importante para o fortalecimento democrático. A diferença é quando o extremo vira a representação do poder. Quando se cultua a xenofobia e a intolerância. Quando se discursa que “as minorias se curvam ou desaparecem”, como Bolsonaro realizou na campanha eleitoral. Isso está longe de ser democrático.
As declarações nas redes sociais feitas por Bolsonaro, seus filhos, e aliados mais próximos do governo nesses cem dias de governo vão de encontro a um dos princípios democráticos defendidos pelo filósofo Norberto Bobbio, que é a igualdade de direitos independentes de classe social, sexo, religião e raça. Se bem que a ideia de raça é passível de várias interpretações, vide Lilia Moritz Schwarcz e Claude Lévi-Strauss, mas é sustentável do ponto de vista de defesa aos negros.
A extrema direita no Brasil liderada por Bolsonaro é tão radical que quase todos os seus opositores são chamados de esquerdistas. Partidos, agremiações, universidades, mídia, não escapam do rótulo de “comunistas”. Até o Nazismo é colocado como de esquerda. São argumentos condenatórios que provocam o descrédito das instituições, o que piora ainda mais a legitimidade democrática.
Com isso é uma ilusão pensar que o Bolsonaro da campanha eleitoral seria diferente do Bolsonaro Presidente da República. Muitas de suas promessas, que não foram tantas durante o pleito de 2018, estão sendo cumpridas como a flexibilização do uso de armas; a educação domiciliar; as medidas voltadas em prol de caçadores, atiradores e colecionadores; e o “combate ao marxismo nas universidades” (que reflete no corte de bolsas de estudo e o sucateamento das instituições de ensino). Quase tudo está sendo posto em prática.
No entanto, estas medidas não têm grande apelo popular. Grande parte da sociedade brasileira não é extremista. As pessoas não saem na rua apontando quem é de esquerda ou direita e muito menos as repudiando. Além disto, a maioria dos brasileiros se opõem a liberação de armas – 55% das pessoas, segundo o Datafolha. Isso reflete na aprovação do governo que só atinge 32% nos seus primeiros cem dias de governo, índice mais baixo desde que esse tipo de pesquisa começou a ser realizada, em 1998.
Muito além do discurso ideológico extremista, o governo se ampara, sobretudo, pela promessa da Reforma da Previdência tão aclamada pelo mercado e setores empresariais. É na atuação do ministro Paulo Guedes e na representatividade do ministro Sérgio Moro, que Bolsonaro, de fato, se apoia.
Ele deve saber que minimizar fuzilamento contra negros, como os 80 tiros contra o carro do músico Evaldo dos Santos Rosa no Rio de Janeiro, e de fazer críticas ao Carnaval, são atitudes bastante questionadas. A democracia serve para diminuir os conflitos e Bolsonaro precisa aprender a se subordinar ao interesse coletivo e plural da sociedade, que é bem maior que qualquer discurso intolerante e intransigente.
*Alex Riveiro é doutorando em História Política pela UFBA, cientista político pela UFPE e jornalista.