Correio Braziliense – Em 28 de julho de 2014, morria Theodore “Dutch” Van Kirk, aos 93 anos, em um asilo na cidade de Stone Mountain, no estado norte-americano da Geórgia. Era o último tripulante do Enola Gay, o bombardeiro B-29 usado para lançar a bomba atômica sobre a cidade japonesa de Hiroshima exatamente 78 anos atrás, às 8h15 de 6 de agosto de 1945. O Correio falou com Van Kirk, navegador do Enola Gay, em 4 de agosto de 2005, depois de localizá-lo no mesmo asilo onde morreu. Com a voz tranquila, ele não mostrou nenhum remorso. Disse que a missão foi uma das mais fáceis de sua sua vida e que faria tudo novamente. O cogumelo atômico se elevou a 13 mil metros de altitude acima de Hiroshima. Pelo menos 71 mil pessoas morreram instantaneamente. Até 1950, outras 129 mil não resistiram aos ferimentos e à radiação. Releia a entrevista publicada no Correio em 5 de agosto de 2005.
Aos 84 anos, Theodore “Dutch” J. Van Kirk não se arrepende do passado nem teme seus fantasmas. Em 6 de agosto de 1945, aos 24 anos de idade, ele era o navegador do Enola Gay, o bombardeiro B-29 que lançou a bomba atômica sobre Hiroshima. Em entrevista exclusiva ao Correio Braziliense, por telefone, Van Kirk afirmou que a explosão da Little Boy salvou várias vidas. Na véspera do 60º aniversário da era nuclear, o major Van Kirk, que vive em um asilo em Stone Mountain, na Geórgia (EUA), disse que não sacrificou vidas e culpou o Japão pelo primeiro ataque atômico da história.
De que o senhor se recorda daquela manhã de 6 de agosto de 1945?
Eu me lembro exatamente de tudo. Passei um bom tempo me preparando para lançar essa bomba. Após o dia 16 de julho de 1945, quando testamos a primeira explosão nuclear, começamos a receber as instruções. Tudo que sabíamos é que teríamos de lançar a bomba. Tínhamos três outros aviões a postos, com três alvos diferentes. Decidimos que o nosso avião lançaria a bomba, outro daria cobertura e o terceiro tiraria as fotografias. Fui incumbido de outros detalhes, como estabelecer o horário da decolagem. Teríamos que lançar a bomba pela manhã, pois não teríamos luz para o pouso à noite.
Havia risco de o Enola Gay ser atingido pela bomba?
Foi uma das missões mais fáceis da minha vida. O único risco era ter a certeza de que estaríamos a uma altitude segura, distante o suficiente da explosão.
Os tripulantes do Enola Gay esperavam tanta destruição provocada pela bomba?
Sim. Foi exatamente por essa razão que lançamos a bomba. Queríamos pôr fim à Segunda Guerra, e por isso jogamos a Little Boy sobre Hiroshima.
O senhor faria tudo novamente?
Se tivéssemos as mesmas condições com que trabalhamos naquele dia, com certeza eu faria tudo de novo.
O senhor não experimentou nenhum tipo de arrependimento?
Jamais me arrependi. Nós jogamos a bomba para terminar com a guerra. Havíamos alertado o governo japonês a aceitar a rendição incondicional. Os japoneses a ignoraram.
Takashi Morita, um sobrevivente de Hiroshima, me disse que o Japão se renderia em uma semana…
Não tenho ideia de onde ele tirou essa informação. Não havia nenhum sinal de rendição. Eles estavam negociando com Moscou. Tóquio exigiu que saíssemos da região e apresentássemos nossa rendição. Depois que lançamos a bomba, a guerra acabou.
Foi justo sacrificar milhares de vidas para encerrar um conflito bélico?
Não foi um sacrifício de vidas. Os japoneses que viviam em Hiroshima e Nagasaki deram suas vidas da mesma maneira como os soldados alemães. Há algum tempo, um jornalista me mostrou fotografias das vítimas da bomba. Eu disse, na época, que essas imagens eram muito parecidas com as tiradas após o bombardeio japonês a Pearl Harbor. A culpa por essas imagens deve ser creditada ao governo japonês, que insistiu em continuar a guerra. A bomba atômica salvou muitas vidas.
A proliferação nuclear é um risco iminente?
A bomba atômica começou quando os cientistas manipularam o átomo no laboratório. A proliferação nuclear ocorreria mesmo se não tivéssemos jogado a bomba. Os russos estavam interessados em obter armas atômicas durante a Guerra Fria.