Rodrigo Craveiro/Correio Braziliense
Depois de ameaçar pôr fim à força-tarefa de resposta ao novo coronavírus, no começo do próximo mês, o presidente Donald Trump desistiu da ideia e comparou a pandemia a duas das maiores tragédias da história dos Estados Unidos. “Este é, realmente, o pior ataque que já tivemos. É pior do que Pearl Harbor. É pior do que o World Trade Center. Nunca houve um ataque como este. E ele nunca deveria ter ocorrido”, afirmou o republicano, durante a assinatura da Proclamação em Honra do Dia Nacional dos Enfermeiros, no Salão Oval da Casa Branca. “(O ataque) Poderia ter sido contido na fonte. Poderia ter sido parado na China. Deveria ter sido parado na fonte, e não foi”, acrescentou. A declaração do magnata e a manutenção da força-tarefa marcam uma guinada na retórica presidencial, a pouco menos de seis meses das eleições. Também ontem, o governo Trump tornou a colocar a China sob suspeita em relação à origem da doença.
Em 10 de fevereiro passado, Trump disse que o novo coronavírus “milagrosamente” desapareceria em abril. Duas semanas depois, assegurou que a covid-19 estava “sob controle” nos EUA. A Casa Branca impulsionou, nos últimos dias, uma disputa contra governadores reticentes à retomada das atividades econômicas do país. “A força-tarefa tem feito um ótimo trabalho”, acrescentou, ao citar a fabricação de milhões de máscaras e a testagem de cidadãos — mais de 7,7 milhões de resultados de testes foram divulgados. “Eu não sabia o quão popular era esse grupo de trabalho”, ressaltou, ao revelar que a força-tarefa poderá ganhar mais dois ou três integrantes. “É muito apreciado pelo público.”
Até o fechamento desta edição, a covid-19 tinha matado 72.812 norte-americanos (30 vezes mais vítimas do que no bombardeio japonês a Pearl Harbor e 24 vezes mais do que os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001). O novo coronavírus infectou 1,2 milhão de cidadãos dos EUA. Vários modelos epidemiológicos sustentam que o número de óbitos no país deve chegar a 100 mil antes do início de junho.
Professor de medicina da Universidade Johns Hopkins e da Universidade Georgetown, Lawrence Gostin disse ao Correio que a pandemia de covid-19 “levou mais vidas em questão de meses do que em muitos anos da Guerra do Vietnã” (1955-1975). “Assim como Pearl Harbor, ela se transformou em crise nacional. Trump não tem escutado os conselhos dos cientistas. Ele ameaçou dissolver a força-tarefa de resposta à covid-19 e está politicamente tão motivado a reabrir o país que ignorou as recomendações da saúde pública”, explicou.
Para Gostin, Trump é o “responsável” pela epidemia da covid-19 nos EUA. “Ele teve várias semanas para se preparar e não deu uma orientação clara e consistente ao público. O governo não intensificou a testagem e o rastreamento de contatos de infectados, a fim de controlar a epidemia no país. Enquanto isso, o presidente atribuiu a culpa à China e à Organização Mundial da Saúde (OMS), quando, na verdade, é o seu próprio governo que deveria ser responsabilizado”, acrescentou.
Laboratório
Na última segunda-feira, o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, anunciou que há “uma grande quantidade de evidências” de que o novo coronavírus saiu de um laboratório do Instituto de Virologia de Wuhan, na província de Hubei, região central da China. Ontem, o chefe da diplomacia de Washington alegou que “não tinha certeza” da culpabilidade chinesa, mas “evidência significativa”. “Não temos certeza, mas há evidência significativa de que isto veio do laboratório. Estas duas afirmações podem ser verdadeiras. (…) O povo americano ainda está em risco porque não sabemos se começou no laboratório ou se começou em outro lugar. Existe uma maneira fácil de encontrar a resposta para isso: transparência, abertura, o tipo de coisa que as nações fazem quando realmente querem fazer parte da solução para uma pandemia global.”
A televisão estatal chinesa classificou as acusações como “insanas”, enquanto a OMS as tachou de “especulativas”, sob a falta de provas. “O senhor Pompeo se expressou em várias ocasiões, mas não pode apresentar provas”, disse a porta-voz do ministério chinês das Relações Exteriores, Hua Chunying. “E por quê? Porque não há nenhuma.”