Joelmir Tavares/Folhapress
Dona do recorde de votos obtidos por um deputado no Brasil (incluindo estaduais e federais), Janaina Paschoal (PSL) entrou na reta final de seu mandato na Assembleia de São Paulo em meio à indefinição sobre seu futuro e aos dilemas da direita que eclodiu com Jair Bolsonaro em 2018.
Antipetista acima de tudo, a advogada e professora de direito da USP mantém relação ambígua com o presidente, alternando críticas e elogios. Nos últimos tempos, a defesa do governo tem sobressaído, diante de algo que ela diz lamentar: a direita só ter Bolsonaro como opção para 2022.
O raciocínio tem sido exposto pela deputada a quem a procura para falar do pleito eSenado, disputa, eleições 2022, b olsonaro
da sua decisão –segundo ela, irreversível– de não tentar a reeleição nem a Câmara, mas, sim, uma vaga no Senado. Se o plano será possível, nem a própria tem muita certeza.
Depois dos 2 milhões de votos na primeira eleição que disputou, impulsionada pela fama de coautora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff (PT), Janaina tem à frente uma série de obstáculos se quiser sobreviver na política.
“Muita gente tem me desincentivado a tentar o Senado, dizendo que é uma loucura, que é uma eleição mais difícil que a do Governo [de São Paulo]. Mas eu cismei”, diz Janaina à Folha. “Minha lógica não é a de ‘onde eu vou ganhar’, ‘onde está garantido”.”
“Sou a melhor candidata. A mais bem formada, a mais preparada para a função. Se o povo vai achar também e dar o voto para mim, aí é outra história.”
Adversários levantam dúvidas sobre sua capacidade de repetir o sucesso nas urnas sem um fenômeno como a onda conservadora de 2018 e com o complicador de ter passado à condição de persona non grata para alas da direita.
No Twitter, a deputada reafirmou nos últimos dias que não vê motivo para impeachment e que o instituto “não pode ser banalizado” –posição que contrasta com ações dela em 2020, quando defendeu na tribuna a saída do presidente e pediu a renúncia dele.
Agora, ela prega cautela diante das revelações da CPI da Covid no Senado. “Eu acho que tem que apurar.”
Com a desobediência à regra tácita da cartilha bolsonarista que veta críticas ao presidente, Janaina já foi tachada até de comunista, mas mantém um pé no barco do apoio à reeleição enquanto não vê surgir uma opção de terceira via competitiva e sem vestígio esquerdista.
Seu candidato dos sonhos é o ex-ministro Sergio Moro. O ex-juiz, no entanto, tem sinalizado distanciamento do jogo eleitoral. Se não tiver saída, a deputada votará no atual mandatário para evitar uma vitória do ex-presidente Lula (PT), cenário que a apavora.
Na jogada de morde e assopra, ela chega a afirmar que a volta do petista ao páreo, graças ao Supremo Tribunal Federal, foi culpa de Bolsonaro, que, ao fazer um governo atrapalhado, deu motivo a uma decisão da corte que ela considera mais política do que jurídica.
Janaina nega, no entanto, que um cálculo eleitoral esteja embutido nos acenos às hostes bolsonaristas. Afirma se preocupar, antes de tudo, com o país e a chance de retorno do PT. E diz que fará sua escolha só em 2022.
“Eu não voto no Lula. Do ponto de vista ideológico, muito embora eu não seja alinhada com Bolsonaro, ele é menos ruim do que a linha do Lula, para mim.”
Consolidar sua própria candidatura dependerá, sobretudo, de um acerto com o PSL. O partido ainda costura alianças para a eleição e não tem definição de nomes. Recentemente, abriu diálogos com o MBL (Movimento Brasil Livre) e com o comando do MDB.
Dirigentes da sigla reclamam do pouco envolvimento de Janaina na discussão mais ampla sobre terceira via e palanques estaduais. A avaliação é que a participação ativa ajudaria a emplacar sua campanha.
Para o presidente estadual do PSL, o deputado federal Junior Bozzella, ter a deputada na disputa ao Senado é possível, mas envolve vários fatores. O partido filiou o apresentador José Luiz Datena e pretende lançá-lo à Presidência. Ele, porém, vem dizendo que prefere concorrer ao Senado por São Paulo.
“Janaina tem capital político para disputar qualquer cargo, mas eleições têm que ser analisadas de acordo com o momento. Toda candidatura, principalmente majoritária, deve nascer de um sentimento coletivo”, afirma Bozzella.
O dirigente vê as aparentes contradições de Janaina como um trunfo. “Ela tem perfil combativo, um lado mais lavajatista. Faz as ponderações sobre Bolsonaro, mas também atuou no impeachment do PT. Tem transparência e carrega o antipetismo. Pegaria moderados e bolsonaristas arrependidos.”
A recordista de votos é automaticamente consultada no PSL para outras disputas. Já foi sondada para a Presidência, o que ela –que quase foi candidata a vice de Bolsonaro– descartou. Também recusou a campanha à Prefeitura de São Paulo.
São Paulo terá apenas uma vaga a preencher no Senado na eleição do ano que vem, o que tornará a briga mais apertada. Apoiador de Bolsonaro no estado, o empresário Otavio Fakhoury prevê um caminho pedregoso para Janaina caso concorra a senadora. Para ele, as críticas a fizeram perder apoios no eleitorado bolsonarista.
“Quem buscar ‘o candidato do Bolsonaro’ não vai votar nela, mas quem estiver atrás de um candidato independente pode votar. Resta saber se esse apoio é suficiente para compensar a perda”, analisa.
Para Fakhoury, que foi investigado no recém-arquivado inquérito dos atos antidemocráticos no STF e sempre negou envolvimento com ilegalidades, um eventual apoio de Bolsonaro a ela é incerto.
“Se sai o [Abraham] Weintraub ou o Luiz Philippe [de Orléans e Bragança] ou o [Ricardo] Salles candidato ao Senado, aí diminui muito a possibilidade de ela ter o voto conservador”, afirma.
Janaina diz acreditar que as pessoas dispostas a votar nela são as “que não têm o perfil de procurar líderes, que gostam de refletir, de ter autonomia, sem essa coisa de endeusamento de políticos”.
“Recebo muitas mensagens de gente arrependida [pelo voto em mim], mas também de pessoas que falam: ‘Percebo que você não é radical, olha os fatos, o mérito da matéria’. Acho que o meu diferencial é ser uma pessoa técnica.”
Na Assembleia, onde até rivais reconhecem aspectos da colega como dedicação e assiduidade, Janaina –que é líder da bancada do PSL neste ano– elevou o tom contra a esquerda desde a recuperação dos direitos políticos de Lula.
“Temos uma divergência histórica”, afirma a líder do PT na Casa, deputada Professora Bebel. “Nós, petistas, temos muito claro que a participação dela no impeachment da presidenta Dilma mergulhou o país nesta situação em que está.” Para ela, a opositora faz “a política do ódio”.
Sobre a candidatura ao Senado, Bebel se limita a dizer que “é um direito” de Janaina. “Não tenho como dizer de antemão se ela tem viabilidade. Temos um país a ser reconstruído, após o desastre promovido por esse governo que ela apoiou.”