Estado de Minas/Diário de Pernambuco
No período em que os profissionais de saúde encaram momentos de apreensão na linha de frente de enfrentamento do novo coronavírus, médicos, enfermeiros e outros funcionários da Santa Casa de Montes Claros, no Norte de Minas, presenciaram um acontecimento inusitado e carregado de emoção: um casamento dentro do ambiente hospitalar.
Internada, em estado terminal de câncer, a professora Aline de Lourdes Laura Gonçalves, de 46 anos, disse que tinha como desejo a oficialização do matrimônio com o caminhoneiro Cícero Clementino dos Santos, de 49, com quem convive há 18 anos.
O sonho de Aline foi realizado na noite de sexta-feira (5). Mesmo com Aline dando o “sim” deitada no leito hospitalar, a cerimônia foi realizada como manda o figurino.
Com um vestido branco, a noiva entrou no hall da enfermaria da ala azul do hospital em uma maca alta, acompanhada por enfermeiras e técnicas de enfermagem.
No local, parentes de Aline aguardavam o momento emocionante, devidamente protegidos por máscaras, além de outros cuidados preventivos, para evitar a transmissão do novo coronavírus.
Ao som da Ave Maria, tocada via aparelho celular, Aline trocou as alianças com Cícero, agora, seu “legítimo esposo”, com quem tem duas filhas: Maria Teresa, de 17, que foi a porta-aliança, e Maria Cecília, de sete.
Ao final da celebração, entre aplausos, instantes de cuidados e felicidade, o pai de Aline, João Gonçalves Filho, de 78, em nome de toda a família, muito emocionado, abençoou o casal.
O matrimônio foi celebrado pelo padre Ildomar Pereira, capelão da Capela da Santa Casa de Montes Claros. Ele recebeu autorização do arcebispo metropolitano de Montes Claros, dom João Justino de Medeiros, para realizar o casamento no hospital.
Cuidados paliativos
Integrante de uma família de quatro irmãos, a professora luta contra o câncer desde maio de 2019, quando foi diagnosticada com um tumor no intestino. Ela passou por cirurgia, mas a doença teve metástase, alcançando fígado, pulmão e os ossos.
Aline foi internada na Santa Casa pela última vez em 28 de maio, recebendo cuidados paliativos.
Conforme a empresária de eventos Márcia Aparecida Gonçalves, de 53, irmã da professora, Aline pediu que tivesse realizado o sonho de oficializar a relação com Cícero, demonstrando muito amor ao companheiro.
“Meu Deus! Que maravilha! Eu amo esse homem. Vou realizar o meu sonho”, foram as palavras da paciente, ao saber que teria o pedido atendido dentro hospital, segundo relato de Márcia.
A empresária conta que a irmã fez questão de usar vestido de noiva para a ocasião: “Ela sempre me falava sobre isso. Conversamos com o padre e ele pediu autorização ao bispo”.
Márcia lembra ainda que a família teve que agilizar a preparação para realizar a cerimônia na noite de sexta-feira, pois o noivo teria que pegar a estrada no outro dia, sábado (6), às 6h.
“Agilizamos tudo. Compramos o vestido, sapatilha e bijuterias. Foi um corre-corre”, conta Márcia, recordando-se dos dias difíceis, quando a irmã foi hospitalizada por causa de uma febre alta: “Ela teve convulsão, o médico falou que não sobreviveria”. Após uma promessa para Santa Laura feita pela mãe, Aline se fortaleceu.
Márcia também dá uma demonstração de amor e dedicação à irmã. “Sempre a protegi e a apoiei em toda a sua caminhada”, diz a empresária, que acompanha Aline, em estado terminal, no hospital.
“É muito doloroso saber que (a gente) vai perder uma irmã para essa doença maldita. Mas nossa fé em Deus conforta meu coração. E esta estadia aqui na Santa Casa nos mostra muitas dores e curas também. Um aprendizado”, conclui Márcia Gonçalves.