De repente, Ciro Gomes passou a encher a linguiça do noticiário eleitoral, por enquanto mais tripa do que carne. Tornou-se moda assim que o último “outsider” evaporou de vez. Entende-se.
Lula da Silva está condenado à cadeia em Curitiba; o PT está imóvel, em transe sebastianista, preso a um caudilhismo místico-judicial. Marina Silva (Rede) apenas de vez em quando manda cartas do exílio político em que se isolou.
Geraldo Alckmin (PSDB) faz política fractal, digamos, dando sempre a impressão de que joga parado. Não é bem assim, mas acaba por não render muita chacrinha.
Se algo se move ou assim parece, é Ciro Gomes (PDT).
A evaporação de Joaquim Barbosa deixou na calçada um pacote de votos sem dono e um partido de súbito solteiro. Em termos eleitorais, é plausível e relevante um casamento do PDT de Ciro com o PSB. O candidato aproveitou a deixa e ocupou o resto do palco com outras notícias.
Ciro pode fazer de Benjamin Steinbruch o seu vice. O empresário, adepto do nacional-empresismo dos anos petistas, filiou-se ao PP, partido do centrão em tese aliado de Rodrigo Maia (DEM). Do outro lado do palco, Ciro faz a cena da frente de esquerda, com Manuela d’Ávila, do PC do B.
Ciro é sobrevivente de uma espécie de seca política, de um sertão no qual se meteu na maior parte dos últimos 20 anos. Parece hoje em dia um tanto esquisito, em especial no centro-sul do país, mais ainda na elite; causa nojinho à finança. Não foi sempre assim.
Foi tido como revelação. Fez carreira rápida no establishment. Aos 33 anos, era eleito governador do Ceará. Aos 36, foi ministro da Fazenda. Era da cúpula do PSDB, para onde foi levado por Tasso Jereissati.
Os dois fizeram uma limpa no horrível atraso do governo do Ceará, então dominado até o último contínuo por apaniguados de coronéis. Fez administração razoável e muito bem avaliada pela população.
Foi nomeado por Itamar Franco para tocar a Fazenda nos últimos quatro meses de seu governo, 1994, quando se implantava o Plano Real, dias difíceis. Era meio esnobado pela equipe econômica, que tocava o plano sob supervisão distante de FHC, em campanha para presidente. Mas manteve o barco no rumo.
Brigou com o PSDB fernandino e paulistano. Não se dava com o MDB nem com o PT. Batia no PSDB, mas foi contra o “Fora, FHC!” e a campanha petista pelo impeachment. Apoiou Lula no segundo turno de 1998 e no de 2002.
De 1996 a 2002, tentou inventar uma frente de centro-esquerda, um caminho do meio entre petistas e tucanos, que dominariam o país de 1994 a 2014. Não rolou.
No poder, Ciro não bebeu água quente nem rasgou dinheiro. Estourado sempre foi, mesmo quando no establishment. Com algumas ideias econômicas exóticas, pegou fama de esquisito de vez ao se envolver com uma história de defesa de renegociação da dívida externa em 1999, tida como calote.
No entanto, causou espanto ao contar com a assessoria econômica de José Alexandre Scheinkman na campanha de 2002. Economista reputado, radicado nos EUA, ultraliberal, Scheinkman foi um dos autores da “Agenda Perdida”, programa que foi oferecido ao PSDB de José Serra, frequentou a campanha de Ciro, foi em parte adotado no governo do PT, com Antonio Palocci, e reencarnou em certa medida na Ponte para o Futuro de Michel Temer.
Ciro tem dificuldades no centro-sul, ideias econômicas ainda nebulosas e precisa dizer novidade marcante a um eleitorado desiludido ou furioso com a política. Mas se move.