Por: Juliane Marinho/ Diário de Pernambuco – Em entrevista exclusiva ao Diario de Pernambuco, o deputado federal Carlos Veras (PT), único representante do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados na atual legislatura e vice-líder da sigla na Casa, deu detalhes da primeira visita a Pernambuco do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em seu terceiro mandato à frente do Executivo Federal, na próxima quarta-feira (22).
Coordenador da bancada da Construindo um Novo Brasil, Veras falou sobre as movimentações para reincluir o ramal Salgueiro-Suape no projeto da Transnordestina, alterado durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), um esforço que, segundo ele, vai precisar da união entre o Governo Federal e o Governo de Pernambuco, além da bancada pernambucana no Congresso Nacional.
Entre outros assuntos, o deputado ainda pontuou as articulações pelas reforma trabalhista, tributária e previdenciária, além das medidas a serem implementadas pela atual gestão do Palácio do Planalto para fortalecer estatais federais em Pernambuco, a exemplo da Sudene, Chesf, Codevasf e do Banco do Nordeste, órgãos que estão no centro da disputa por partidos que apoiaram a eleição de Lula.
1. O presidente Lula vem a Pernambuco na próxima semana para relançar o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Qual é a importância do PAA para o Brasil e por que Lula escolheu o estado para o ato de lançamento?
O PAA foi criado no governo Lula em 2003 com duas finalidades básicas: promover o acesso à alimentação e incentivar a agricultura familiar no contexto do programa Fome Zero, incluindo ações vinculadas à distribuição de alimentos para pessoas em situação de insegurança alimentar e à formação de estoques estratégicos, mediante a compra da produção de agricultores familiares, assentados da reforma agrária e comunidades tradicionais.
Hoje, mais do que nunca, com o Brasil colocado no Mapa da Fome da ONU (Organização das Nações Unidas) pelo governo Bolsonaro, que acabou com o PAA, com 33 milhões de brasileiras e brasileiros famintos, o relançamento desse programa, vinculado a outras iniciativas no setor, é fundamental para resgatar a dignidade e a saúde do povo brasileiro e fomentar a agricultura familiar, que coloca o alimento em 80% das mesas das famílias brasileiras.
O programa vai voltar a beneficiar indígenas, quilombolas, extrativistas e pescadores artesanais, além de escolas, asilos e outras instituições que atendem pessoas em situação de insegurança alimentar. E mais, o PAA promove o abastecimento alimentar por meio de compras governamentais de alimentos; fortalece circuitos locais e regionais e redes de comercialização; valoriza a biodiversidade e a produção orgânica e agroecológica de alimentos; incentiva hábitos alimentares saudáveis e estimula o cooperativismo e o associativismo.
E o lançamento do PAA em Pernambuco sintetiza toda a força do povo nordestino e brasileiro que resistiu bravamente durante os quatro anos perante um desgoverno que jogou o país no buraco. Aqui, juntamente com a Fetape (Federação dos Trabalhadores Rurais e Agricultoras Familiares do Estado de Pernambuco), o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e organizações do campo, eu e o deputado estadual Doriel Barros (PT) conseguimos aprovar o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (Paaf), bem como guardar a simbologia da importância de um desenvolvimento regional equânime, além de ser a terra natal do presidente Lula.
2. A construção do ramal ferroviário Salgueiro-Suape da Transnordestina sofreu uma derrota no apagar das luzes de 2022. Um aditivo ao contrato de concessão assinado entre a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e a Transnordestina Logística SA excluiu o trecho pernambucano do projeto. Existe alguma possibilidade de reverter esse acordo junto ao governo Lula?
Primeiramente, é importante lembrar que quem retirou o ramal Salgueiro-Suape do desenho do projeto original foi o governo Bolsonaro. Temos a certeza de que o governo do presidente Lula vai revisar o contrato, que prejudica enormemente o desenvolvimento do estado de Pernambuco e de toda a região Nordeste. Isso porque tal decisão não só permite à concessionária devolver o trecho de Pernambuco na Transnordestina, como também impede que uma nova concessão seja realizada até o ano de 2029.
Para destravar a obra do trecho Salgueiro-Suape, já estamos dialogando com os ministérios da Integração e do Desenvolvimento Regional e dos Transportes para buscar as alternativas de financiamento para o retorno dos trabalhos e dar velocidade à conclusão da Transnordestina. Os governos federal e estadual, juntos, devem pensar soluções a fim de acelerar essa entrega, que mais do que um modal de transporte, será uma obra estratégica para fomentar a economia, gerar emprego e renda e novas oportunidades de negócios.
Desse modo, o quanto antes for apresentada uma proposta capaz de dar mais agilidade à conclusão da obra, mais cedo serão abertas as portas para a chegada de investimentos de outros setores para Pernambuco e para o Nordeste.
3. O senhor é o único deputado federal pelo PT de Pernambuco. Essa condição aumenta sua responsabilidade no âmbito da atração de investimentos e políticas públicas para Pernambuco?
Certamente que sim. Meu compromisso é o mesmo do primeiro mandato. Mas com o governo do presidente Lula, e o fato de eu ser o único deputado petista por Pernambuco, naturalmente aumentam as expectativas e as demandas com relação ao nosso trabalho. Ainda mais agora que fui eleito um dos vice-líderes do PT e coordenador da bancada petista CNB (Construindo um Novo Brasil) na Câmara dos Deputados.
Desde o início de janeiro venho recebendo a visita de dezenas de prefeitos de todas as regiões de Pernambuco em busca dessa aproximação com o governo Lula. Na pauta de requerimentos dos gestores pernambucanos constam importantes obras de infraestrutura como a Transposição do Rio São Francisco e a construção da Ferrovia Nova Transnordestina, além da recuperação, fortalecimento de empresas públicas e órgãos públicos federais, como a Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) e a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), bem como a reestatização da Chesf (Companhia Hidroelétrica do São Francisco).
As organizações sindicais e sociais também têm buscado o nosso mandato na luta por seus direitos, entre elas, a CUT-PE (Central Única dos Trabalhadores de Pernambuco), a Fetape e o MST para a revisão das reformas trabalhista e previdenciária, a garantia de investimentos para a agricultura familiar e a defesa dos direitos humanos, além do combate à fome e a defesa da democracia.
4. Sobre a Sudene, o Banco do Nordeste e a Chesf, como o senhor pretende proceder no sentido de fortalecer e resgatar empresas públicas como aportes fundamentais ao desenvolvimento de Pernambuco?
Primeiramente, precisamos garantir um volume significativo de recursos do Governo Federal para enfrentar o desmonte e sucateamento dessas empresas públicas promovido nos últimos anos pelos governos Temer (MDB) e Bolsonaro, a fim de garantir o cumprimento de suas atribuições, bem como o aprimoramento delas em favor do povo pernambucano e nordestino. A Sudene e o Banco do Nordeste, por exemplo, são empresas públicas que exercem papéis estratégicos para os desenvolvimentos social e econômico de Pernambuco e do Nordeste. Quanto à Chesf, vamos lutar por sua reestatização, tendo em vista que a privatização de uma instituição desta estatura significaria privatização de recursos naturais, a exemplo do Rio São Francisco, assim como comprometeria nossa soberania e sustentabilidade energéticas.
Também precisamos garantir a valorização das servidoras e servidores públicos que são imprescindíveis para a execução adequada e qualificada das ações administrativas do estado e das políticas públicas. Nesse sentido, é necessário realizar concursos públicos para ampliar o quadro de funcionários, assegurar a estabilidade, promover ações de qualificação profissional e salários dignos.
As ações relativas ao fomento da economia urbana e rural, ao desenvolvimento da região Nordeste e à garantia da sustentabilidade energética, por exemplo, comandadas por essas empresas, são vitais para o nosso estado e região. Portanto, sua recuperação e fortalecimento de suas atribuições devem ser consideradas prioritárias entre as medidas do Governo Federal que visam um projeto de desenvolvimento regional equânime e integrado.
5. No que se refere à reforma trabalhista, a bancada do PT pretende atuar para revogar essa lei ou revisá-la?
A recuperação econômica começa pela revisão das reformas trabalhista e previdenciária. A flexibilização da lei trabalhista não reduziu o desemprego, conforme propalado. Pelo contrário, causou uma destruição avassaladora nos direitos e na qualidade de vida da classe trabalhadora. A geração de emprego e renda é a principal chave para fazer o país andar novamente e acabar com a fome, sendo a revisão dessa reforma a condição primeira para o Brasil conseguir avançar.
É certo que não basta apenas gerar postos de trabalho, é preciso, junto com isso, retomar os direitos dos trabalhadores e trabalhadoras e fazer do contrato de carteira assinada a regra das relações trabalhistas, não a exceção. Dessa maneira, é urgente construir uma verdadeira contrarreforma, com segurança jurídica para trabalhadoras e trabalhadores e também para as empresas a fim de dar início ao período de recuperação econômica, atuando para garantir emprego para todas e todos, com salário e condições de trabalho dignas.
6. E quanto à reforma da previdência?
A previdência é um patrimônio público que deve ser preservado. Por isso, vamos seguir na luta para que a seguridade social seja capaz de cuidar do povo brasileiro. O debate tendo em vista a revisão da reforma da previdência não pode prescindir do debate acerca da reforma tributária progressiva, com maior taxação de quem ganha mais e menor taxação dos mais pobres. Assim como é necessário diversificar as fontes de financiamento para ampliar a proteção social e cobrar os grandes devedores do setor que refinanciam a cada tempo suas dívidas e não cumprem os acordos. É importante lembrar que a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Previdência apontou que os maiores devedores do sistema devem mais de R$ 500 bilhões.
Oportunamente, destaco que a garantia do direito previdenciário passa necessariamente pela valorização das servidoras e servidores públicos, realização de concursos públicos e contratação dos aprovados e reestruturação das agências e postos de atendimento.
Por fim, é impossível pensar num país civilizado e soberano sem que o Estado cuide do seu povo. E esse cuidado passa necessariamente pela garantia de uma política de seguridade social que proteja as cidadãs e os cidadãos brasileiros. Revisar as reformas trabalhista e previdenciária não será uma tarefa fácil, considerando a composição conservadora majoritária do Congresso Nacional, mas a gente vai seguir firme na luta com o apoio do governo Lula em defesa dos direitos da classe trabalhadora e do povo brasileiro de modo geral.