Várias pontas soltas ameaçam eleição de Bolsonaro em 2022

Por: Jorge Vasconcellos  /Ingrid Soares / Correio Braziliense
O presidente Jair Bolsonaro deu um passo importante no projeto de reeleição ao ingressar no Partido Liberal (PL), uma sigla com ramificações pelo país, caixa forte e estrutura política adequada para o tamanho da disputa. Daqui em diante, o principal desafio do mandatário será demonstrar que merece a confiança do eleitor para exercer um novo mandato no Planalto. A caminhada, porém, não será nada fácil, com adversários competitivos, poucos resultados governamentais a mostrar e um quadro econômico e social cada vez mais deteriorado.
A pouco menos de um ano das eleições de outubro de 2022, o presidente amarga os piores índices de popularidade desde que tomou posse — entre 20% e 23%, dependendo do instituto que realiza a pesquisa, perdendo apoio entre grupos importantes, como evangélicos. Isso, ao mesmo tempo em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) segue como favorito na preferência do eleitorado, e o ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro (Podemos) tem sido visto como uma ameaça à ida de Bolsonaro ao segundo turno do pleito.
Para quem acompanha o atual cenário político, porém, ainda é muito cedo para dizer que o presidente chegará enfraquecido no pleito, já que contará com os palanques do PL nos estados, o apoio de outros partidos do centrão e, o mais importante, o controle da máquina pública. Mas, permanentemente, Bolsonaro vem deixando pontas soltas que podem prejudicá-lo na campanha.
Dificuldades
A mais recente foi a confissão que fez, em um evento na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), na última quarta-feira, de que interferiu na administração do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para favorecer o empresário Luciano Hang, que o apóia — leia mais na página 6. Além disso, a inabilidade na articulação política dentro do Congresso tem tudo para trazer problemas a longo prazo.
Tal como a saída de Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) da liderança do governo no Senado. Postulante à vaga no Tribunal de Contas da União (TCU), foi abandonado pelo Palácio do Planalto com parcos sete votos — e viu o senador Antonio Anastasia (PSD-MG) levar a vaga, com 52 votos, em eficiente articulação feita pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), provável adversário de Bolsonaro nas urnas.
Na corrida eleitoral, o presidente tem um flanco aberto que, certamente, será explorado pelos rivais: a animosidade com o Supremo Tribunal Federal (STF). Também na semana passada, Bolsonaro voltou a colidir com os ministros da Corte — dessa vez, porém, não foi com seus alvos preferenciais, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Classificou Edson Fachin como “trotskista e leninista” — aliás, correntes do antigo comunismo soviético que entraram em confronto — por ter votado pela atualização do novo marco temporal de demarcação de terras indígenas.
Se a nova crítica excitou a fiel base bolsonarista, a resposta institucional veio no mesmo diapasão. A menção a Fachin fez com que o ministro Luiz Fux, presidente do STF, mandasse um duro recado ao presidente, na última sexta-feira, no fechamento do ano para o Poder Judiciário. “Ao longo do último ano, esta Suprema Corte e o Poder Judiciário como um todo enfrentaram ameaças retóricas, que foram combatidas com a união e a coesão de seus ministros, e ameaças reais, enfrentadas com posições firmes e decisões corajosas desta Corte. Acima de tudo, o ano de 2021 demonstrou que o Supremo Tribunal Federal não consiste em ‘onze ilhas’, como alguns insistem em dizer”, destacou.
O analista político do portal Inteligência Política, Melillo Dinis, não acredita em uma vitória em primeiro turno de nenhum dos candidatos nas eleições presidenciais de 2022. “Mais que ‘eleitores’, teremos ‘rejeitores’, que pensarão mais em derrotar um candidato do que eleger o seu preferido. Vai depender também dos demais concorrentes, especialmente da trinca que forma hoje o núcleo das terceiras vias: (Sergio) Moro, Ciro (Gomes) e (João) Doria”, observa.
Legados
Danilo Morais dos Santos, professor da pós-graduação do Ibmec-DF, ressalta que uma candidatura presidencial custa caro e que Bolsonaro terá que achar outras fontes de custeio para sua candidatura, já que uma parcela significativa dos recursos partidários do PL serão destacados para as campanhas ao Legislativo. Além disso, para ele, a disputa de 2022 será entre legados, já que os dois candidatos favoritos já ocuparam ou ocupam a presidência.
“Lula e Bolsonaro se viram às voltas com escândalos de corrupção e esse tema tende a não ter a força que teve em 2018. De um lado, o governo Lula, com redução da pobreza e o aumento do bem-estar a reboque do crescimento econômico. De outro, o descalabro econômico, fiscal, sanitário e humano do atual governo. A eleição se resolve pelo eleitor mediano, que é pragmático: na disputa entre esses legados, a inclinação é francamente favorável a Lula”, salienta.