“Queria estar no voo”, diz brasileiro que perdeu marido em queda de avião…

O brasileiro Claudio Manoel Villaça Vanetta (à esq.) com o companheiro Glenn Thomas (Foto: Reprodução/Facebook/Claudio Manoel Villaça Vanetta)

O brasileiro Claudio Manoel Villaça Vanetta (à esq.) com o companheiro Glenn Thomas (Foto: Reprodução/Facebook/Claudio Manoel Villaça Vanetta)

O brasileiro Claudio Manoel Villaça Vanetta lembra exatamente a hora da última ligação que recebeu de seu marido, o inglês Glenn Thomas: 11h32, horário de Amsterdã. Como fazia sempre que viajava, Glenn, que era jornalista da Organização Mundial da Saúde (OMS), ligava para o companheiro logo antes de embarcar. “Ele me mandou um beijinho e disse: ‘Assim que eu chegar eu te ligo’”, conta.

Mas quem ligou para Claudio algumas horas depois foi o chefe de Glenn, para informar que o avião em que ele estava, o voo MH17 da Malaysia Airlines, havia caído na Ucrânia. Eram 17h30 em Genebra, onde Claudio mora, e ele estava tão concentrado no trabalho que ainda não tinha visto notícias sobre o acidente.

Foi assim que ficou sabendo que havia perdido o companheiro de 11 anos – “11 anos maravilhosos”, como fez questão de frisar durante toda a entrevista –, uma pessoa “com o sorriso mais lindo que o planeta já pôde fazer”.

“Ainda não parece realidade. Parece um sonho, uma brincadeira. Não consigo aceitar”, disse Claudio ao G1. Filho de uma paraense com um suíço, Claudio morou no Brasil até os 10 anos de idade, quando se mudou para o país do pai. Hoje, aos 52, trabalha no departamento financeiro de um banco em Genebra.

Ele conheceu Glenn em um restaurante japonês. “Era uma pessoa extremamente alegre, cheia de humor. Nunca vi um sorriso tão lindo. Era um sorriso mágico, que ele herdou da mãe dele”, conta.

Os dois perceberam logo que tinham muito em comum. “Tínhamos o mesmo senso de humor, o mesmo gosto pela música, por viagens, pela moda. Não precisávamos falar muito. Era uma identificação total”, conta.

O jornalista pegou o voo da Malaysia para participar da Conferência Internacional sobre a Aids, que começa neste domingo (20) na Austrália. Ele costumava viajar a trabalho pelo menos uma vez por mês. No dia em que saiu de Genebra para Amsterdã, Glenn deixou Claudio no trabalho. Comentaram sobre o tempo, pois era o primeiro dia de calor depois de um mês de julho muito frio na cidade. Ele seguiu, então, em direção ao aeroporto.

Continua…

Festa surpresa de 50 anos
O casal morava junto em um apartamento com varanda, de frente para o lago de Genebra, onde fazia ao menos três jantares por mês e vários eventos ao longo do ano. “Nossa casa sempre foi uma festa. O Glenn adorava receber. E a lista de convidados era eclética. Nunca aceitamos fazer um gueto gay. Tinha artistas, casais heterossexuais com filhos, netos, estagiários da OMS… Era tudo misturado”, descreve o brasileiro, emocionado.

A festa mais especial do ano já estava marcada: Claudio planejou uma surpresa para Glenn, que completaria 50 anos de idade no dia 20 de setembro. A irmã gêmea dele, que mora na Inglaterra, viria para a comemoração.

Na verdade, o presente começou em fevereiro deste ano. “Preparei um jubileu surpresa: faríamos uma viagem por mês para fazer coisas que ele nunca tinha feito. Em Roma ele aprendeu a cozinhar uma refeição romana completa. Em Londres fizemos um percurso nos terraços da cidade. Em Paris, o roteiro da Maria Antonieta. Íamos agora para uma montanha na Suíça, para Saint Tropez e para um safári na África do Sul. Estava tudo planejado”, lamenta Claudio.

Reconhecimento do corpo
Antes de ir para Genebra, Glenn estudou jornalismo em Chicago e morou no Japão e na França. Ele veio ao Brasil três vezes, para visitar a família de Claudio, em Belém. Adorou comer açaí e cavalgar com búfalos na Ilha de Marajó. “Minha família adora ele. Estão todos devastados”, diz o brasileiro.

Os amigos também não param de escrever para o companheiro de Glenn. “Ele tinha muitos amigos. O Facebook está explodindo de mensagens. Há um dia e meio não paro de receber e-mails e mensagens”, conta Claudio. Ele ainda não conseguiu responder a nenhuma.

A próxima etapa será viajar para fazer o reconhecimento do corpo, que pode ser na Ucrânia ou na Rússia. A previsão é que isso ocorra na próxima terça-feira. A ideia da família é fazer a cremação na Inglaterra, na cidade natal de Glenn.

Para lidar com a perda tão abrupta, o brasileiro está sendo tratado por um psiquiatra e conta com a ajuda dos amigos. “Estão todos aqui em casa. Não consigo ficar sozinho. Queria ter estado no mesmo avião que ele, teria sido mais fácil”, disse, emocionado.

Claudio diz que vai ter que aprender a “recomeçar a viver”: “Não sei quanto tempo vai levar, quanta terapia, quanto remédio. Agora vou ter que aprender a viver o vazio.” (G1)